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Estamos em Farminhão, sítio tranquilo. Já escreveu algum livro, aqui?
O último. Estava em quarentena e uma boa parte foi escrita aqui.
Porquê? O que é que esta paisagem de campo traz?
Paz e tranquilidade. O silêncio, a força da natureza das árvores, das plantas…
Alguém que escreve tanto e tão bem, tem de conhecer muitas pessoas para criar personagens. A sua experiência profissional é de uma vida inteira em Gestão de Recursos Humanos…
Vamos lá ver. Eu costumo dizer que a minha mão tem uma simbologia especial. Tenho várias vidas. E, quando olho para os meus dedos, são exatamente cinco vidas. O dedo mindinho representa os meus 18 anos de Viseu: a infância e a adolescência. Depois, o anelar, onde costumamos pôr o anel do compromisso, é o meu lado profissional. Foram 43 anos onde as palavras eram motivação, liderança, equipas, emoções, objetivos, aprendizagem, formação. O meu mundo era essas palavras. O gerir as pessoas é uma coisa encantadora e tem um pouco a ver com o Espelho Meu. Eu descobri há poucos dias que a neurociência descobriu uns neurónios que foram chamados de neurónios espelho. São ativados sempre na relação que temos com os outros, no sentido de descobrirmos no outro sentimentos, intenções, emoções. É isso que procuramos captar no outro. Quando vi esta descoberta, percebi que a minha essência são esses neurónios. Desde miúdo fiz esse exercício de estar no papel do outro: a raiz da empatia. 43 anos foi sempre esse exercício de me colocar no papel do outro para fazer das pessoas normais, talentos.
As pessoas não são todas iguais, mas, tal como na mão, têm de se conciliar. Essa gestão de recursos humanos é outro desafio…
E tem mesmo a ver com isso dos neurónios espelho. Quando tentamos compreender o outro, vemos que ele não é igual a nós. Nós somos reflexo nos outros, mas o universo também é reflexo em nós. Nós projetamos nos outros, mas eles também se projetam em nós.
E as outras vidas?
O dedo que é maior do que os outros representa aquilo que para mim, é-me superior: é a espiritualidade. Acho que desde miúdo tive sempre uma carga de espiritualidade muito grande. Tive uma educação católica como todos tivemos. Vivi algum tempo no México e uma das coisas que quis saber era a religião Maia. Envolvi-me de tal maneira que fui iniciado lá. Ou seja, fui batizado na religião Maia.
Mas sem medos?
Não, por curiosidade. Há uma porta que se fecha quando não entramos nessa porta. Eu precisava de lá entrar para ver o que estava por detrás dela. Mas, depois, no Peru, a curiosidade pelos Incas, também lá fui batizado, crismado e até fiz um casamento Inca, digamos. Eu queria passar sempre essa fronteira. No Brasil, a religião africana, o Candomblé… Também fui crismado. Não é religiosidade. É muito mais espiritual.
Aquela ideia de que Deus está em todos os povos…
Quando discuto com os meus amigos, muitos deles ateus, eu digo-lhes que sou o contrário dos ateus. Sou de todas as religiões. Eu estou aberto a todas as religiões. Todas me têm ensinado coisas. Não sou esta, nem sou aquela, nem sou nada. Sou todas, entende? Esta espiritualidade foi sempre muito importante. Não me esqueço da emoção que foi quando me batizei no Candomblé. O momento especial em que eu tinha de estar de olhos fechados para cruzar e abrir os braços. De repente, comecei a ouvir no peito, deu-me a sensação de que era o coração que estava fora de mim e eu tive uma série de tempo a sentir aquilo. A certa altura disseram-me para abrir os braços e os olhos. E quando o fiz, saiu uma pomba. São momento muito intensos…
E o indicador?
É o que aponta na direção. É o lado do viajante. Foi sempre uma questão muito forte. Para além de viajar por iniciativa própria, tive a felicidade de estar num trabalho sempre feito em viagem. Vivi no México, Cabo-Verde… O viajar pesa muito em mim e está muito patente. Um jornalista disse-me sobre os meus livros que eu misturo a história e a geografia dando sempre um lado inovador.
E o polegar?
Eu desde os artigos à primeira versão dos livros faço-o sempre com a mão. E é este polegar que agarra a caneta.
E porque é que ainda insiste em escrever à mão? Já agora azul ou preta?
Procuro sempre que seja preta, por causa do contraste do preto e do branco, do bem e do mal. É o xadrez do chão da Igreja de Notre-Dame… Escrevo à mão porque sinto que me corre melhor. Já tentei começar no computador e fico um bocado hesitante, não acerto com a tecla, tenho de corrigir e distraio-me muito. Aliás, digo-lhe, que às vezes nem controlo a própria mão. Ou seja, as coisas já não passam pela cabeça e vêm diretamente para a mão.
Um livro deve ter uma mensagem revolucionária?
Os meus professores de português, quando comecei a escrever, diziam-me: “Quando começares a escrever, despe-te. Não tenhas problemas em dizer aquilo que sentes e aquilo que pensas”. É o primeiro princípio. E diziam-me, quando tu vais ao fundo de ti, tu tocas o fundo das outras pessoas. Nós lá no fundo, lá no fundo, somos todos iguais. E, portanto, o que procuro sempre, é fazer esse striptease e, com o meu fundo, tocar o fundo dos outros. Que eles pensem, que eles sintam que também se passa com eles, que também tem a ver com eles. É tocar isso. Uma vez, um amigo numa apresentação de um livro veio ter comigo no fim e disse-me: “Epá, tu não tens vergonha? Tu estás a contar a tua vida..”. E eu disse-lhe para ficar descansado que quando falamos a verdade, ninguém acredita, acham sempre que é ficção.
E nos seus livros está gente de carne e osso que conhece e a quem lhes dá outro nome?
Sim, porque repare, eu quando faço estas viagens, há sempre pessoas associadas. Por isso eu gosto de viajar sozinho para encontrar essas pessoas: o pescador, o tipo que esteve preso não sei quantos anos. Gosto de conhecer essas pessoas. E sinto que, quando vou escrever sobre esses lugares, tenho a obrigação de, além de falar nos lugares, fazer aparecer essas pessoas. E, de uma maneira geral, quando lanço um livro, procuro essas pessoas para lhes deixar um exemplar. Muito da minha aprendizagem foi feita com essas pessoas mais simples. E não me apareceram por acaso. Fazem parte da minha história.
Essas viagens têm de ser feitas com o espírito mais abertas que há…
Por isso é que as faço sozinho. Quando se vai com outra pessoa, mesmo que seja encantadora, estamos sempre preocupados com o outro. E eu não quero estar preocupado com nada. Quero estar. Pura e simplesmente. Tenho um compromisso com os lugares porque esses sítios me inspiraram. Sou, essencialmente, um escritor dos lugares.
E também é um escritor das artes e do talento. Há uma personagem que ambos admiramos que é a Amália e que também está nas páginas que escreve…
Sim, neste último livro “Mar das Guitarras” ela está lá, digamos que bem patente. A forma como ela criou escola. Hoje nós temos gente muito nova a tocar guitarra, viola, a cantar o Fado. Ela fez uma escola e essa gente toda tem sempre a inspiração dela. Um deles, que eu adoro, é o Ricardo Ribeiro, que é, digamos a reencarnação em homem da Amália daquilo que faz de novo e de inovador. A música está sempre presente. Às vezes perguntam-me “O que é que gostavas de ser?”. E eu digo que gostava de ser músico. E tentei ser, mas tive uma professora que só nos ensinava a tocar um instrumento musical e isso fez-me desencantar. Mas temos outra pessoa em comum que é o comendador Rui Nabeiro. Deu-me uma das maiores lições de vida. Vou-lhe contar que tinha que fazer uma conferência sobre liderança em Portugal. E fiz questão de entrevistar vários líderes de referência e, portanto, um deles era o Rui Nabeiro. Isto foi quase há trinta anos. No fim da entrevista que lhe fiz, disse-lhe: “O senhor Rui Nabeiro também teve sorte”. E ele olhou para mim, com o ar paternal e disse-me: “Ó meu filho, tu sabes o que é que é sorte? A sorte é quando as nossas competências encontram as oportunidades. Porque repara tu tendo as competências e as oportunidades não surgindo, não acontece nada e, se for o contrário, também nada acontece. Portanto, é o encontro das oportunidades e das competências que faz com que as coisas aconteçam. Agora repara, tens que andar sempre um passo ou dois à frente para seres o primeiro a ver as oportunidades”. E esta foi a maior lição que tive. Depois conheci o Jorge Amado. Foi a tal sorte. Nós éramos casados com duas irmãs. Ele era o meu cunhado. Depois parte da nossa família era dona do Diário de Lisboa. Quem lá estava? O Sttau Monteiro, o Mário Zambujal, o Saramago, o José Cardoso Pires. É exatamente a história da sorte: tive as oportunidades, mas também tinha as competências.
O Jorge não é de ficar muito tempo no mesmo sítio, é de viajar, é de sair…
Sou um nómada e um construtor de catedrais, no sentido do aprendiz, do oficial e do mestre. Em todas as coisas que fiz tive sempre estas fases: a da aprendizagem, o do fazer e o do ensinar.
O que é que valoriza mais numa pessoa? O que tem uma pessoa de ter?
É que ela diga aquilo que sente. Não o que sabe, mas o que sente.
Portanto, mostrar não que tem muito mundo, mas mostrar o mundo que tem…
Um pouco isso. Ainda voltando ao espelho, de me colocar no papel do outro. Tive, ao longo da vida, coisas muito engraçadas. Pessoas que namoravam com os meus amigos, mas elas gostavam era de conversar comigo e procuravam-me sempre. Diziam-me que eu sabia ouvir. Os pais, os avós, os tios dos meus amigos diziam-me isso. Gostavam de conversar comigo. Passei várias vezes férias com os meus amigos e senti que, apesar de vir de uma família pobre, as pessoas gostavam sempre de mim. Já crescido um advogado chegou a dizer-me: “Ó Jorge, eu não sei o que você tem, mas você é gostável, a gente gosta de si”. E eu vivi um pouco com isso e sempre com a ideia de não desiludir as pessoas. Muitas vezes desiludi, mas sempre com a verdade. Quando as coisas já não eram verdade…
Uma das suas imagens de marca é estar vestido como está hoje, de branco. Porquê?
É branco no verão, e é preto no inverno. Vivo muito esta dualidade do preto e do branco, do bem e do mal, os contrários… Eu acho que também sou muito contraditório.