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Fragmentos de um Diário – 9 de Abril de 1978 (continuação)

 Fragmentos de um Diário - 9 de Abril de 1978 (continuação)
25.09.21
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 Fragmentos de um Diário - 9 de Abril de 1978 (continuação)

E a Fátima? Mal cheguei a Lisboa e ainda antes da entrevista falhada com o tal padre, fui ao trabalho dela. Não a vi. Perguntei por ela à minha tia, que fui cumprimentar. Disse-me que a Fátima tinha emigrado. Assim, sem rodeios, de chofre. Fiquei colado ao chão, pálido, atordoado, sem reação. Só depois, já a despedir-me, se lembrou a minha tia de uma carta que a Fátima lhe deixara.

Fui para o jardim ao lado da feira da Ladra. Nunca li nada tão triste. Não que fosse escrita com sentimentalismo ou pieguice. Não. A carta era curta, quase sem adjetivos, direta. É verdade que começava por me chamar «meu amor», para de imediato esclarecer que, apesar da alegria que sentira com o nosso namoro, intuíra que a nossa história era sem futuro. Eu iria para a universidade, e ela não completara o curso do liceu. Em breve, em poucos anos, essa diferença refletir-se-ia na comunicação entre nós. Talvez a coisa se arrastasse, por pena, por simpatia. Mas isso seria a derrota do nosso encontro. Mas dizia mais, referindo-se ao facto de eu nunca ter proposto que nos correspondêssemos.

Estivera sempre à espera desse pedido, até tinha pensado que as minhas cartas poderiam ser enviadas para o seu trabalho. Mas eu nunca lhe propus isso. E confessa que só tem uma explicação. A minha juventude não se compadece com a ausência. Uma coisa é estar presente, corpo a corpo, outra bem diferente é um namoro à distância. Ela escreve que sentia que eu gostava dela, que não era apenas pelo gozo sensual, não, havia algo mais em mim que estava com ela, algo poético, espiritual, qualquer coisa que nos unia para além do sexo. A propósito, lembra o dia em que eu lhe dissera que o meu desejo não era apenas corporal, mas que as nossas almas também fizessem amor. Com esta frase ela entendera simultaneamente o meu amor e o dom da poesia.

Surgira um convite de uma prima para trabalhar no estrangeiro a ganhar três vezes mais e com alojamento. Era uma oportunidade de tirar a família da miséria. Hesitou. Mas a minha ausência e o meu silêncio ditaram-lhe a decisão. Leva-me consigo para sempre. Saberá cuidar desta grande paixão. A última ideia deixou-me intrigado.

A derrota deste amor derrubou-me interiormente. Como gostaria de saber dizer a multidão de gritos enclausurados!

 Fragmentos de um Diário - 9 de Abril de 1978 (continuação)

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