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A geringonça de Jerónimo

 A geringonça de Jerónimo
30.10.21
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1. Depois das últimas eleições autárquicas, o país pensou que Jerónimo de Sousa, mesmo tendo perdido algumas câmaras, conseguia aguentar a geringonça. Tal não aconteceu. O que terá acontecido? É difícil de dizer, mas pode tentar perceber-se o que se passou dentro do PCP nas últimas semanas.
É provável que o líder comunista ainda tenha tentado segurar mais uma vez o governo do PS, como fizera no ano passado. Até porque o PCP tinha ganhos de causa para apresentar: um aumento extraordinário das pensões logo a partir de Janeiro e creches gratuitas.
Jerónimo deve ter tentado segurar Costa só que, desta vez, já não conseguiu resistir ao descontentamento do partido. Como se diz em comunistês, mudara a “relação de forças” interna. Os sindicalistas sobrelevaram-se aos autarcas. Antes da “tóxica” geringonça, o PCP tinha 34 câmaras, agora só lhe restam 19; antes tinha 19 deputados, agora 12.

2. Recordemos alguns factos básicos do nosso passado político recente:
(i) foi Jerónimo quem criou a geringonça, na noite eleitoral de 4 de Outubro de 2015, quando se dirigiu aos jornalistas com aquele seu célebre: “o PS tem condições para formar governo, mas têm de perguntar ao PS”;
(ii) foi Jerónimo quem pôs as paredes da geringonça a abanar quando, em 2019, se recusou a assinar um “papel” para esta legislatura;
(iii) foi Jerónimo quem implodiu a geringonça esta semana quando votou contra o orçamento.
A geringonça só existiu enquanto o PCP quis, a geringonça só podia existir enquanto o PCP quisesse. António Costa sabia isso.
O primeiro-ministro deu ao PCP o orçamento mais à esquerda de sempre, deu-lhe tudo o que pôde, porque sabia que estava a lidar com um partido leal a negociar, que não fazia fugas para a comunicação social como as primas-donas do Bloco de Esquerda. Deu tudo o que lhe era possível sem pôr em risco a notação da república e a imagem do país nos mercados. Infelizmente, não foi suficiente.
Agora, no pior momento possível, abriu-se uma crise política estúpida: quando o país quer respirar um pouco após o sufoco da peste, quando é necessário dar destino à bazuca europeia que tem prazos de concretização apertados, quando as empresas se vêem a braços com avarias nas cadeias de abastecimento, quando se aproxima o Inverno e o preço da energia sobe todos os dias.

3. Vamos para eleições.
A direita está histérica, com querelas acerca de prazos, antecipações e adiamentos de congressos, o diabo-a-quatro. Paulo Rangel quer que Marcelo marque eleições a 20 ou 27 de… Fevereiro. Pelo que se tem percebido, as madalenas-arrependidas do bloco e do PCP preferiam-nas a 30 do mesmo mês.
Está tudo lélé-da-cuca, como diria Marcelo Rebelo de Sousa depois de pagar uma conta no multibanco.
Lembremos um exemplo prático: o parlamento grego foi dissolvido em 31 de Dezembro de 2014, três semanas e quatro dias depois a Grécia foi a eleições e escolheu Aléxis Tsípras que formou governo logo a seguir. Por cá, o governo caiu no dia 27 de Outubro com o chumbo do orçamento, vamos ter eleições provavelmente a 23 ou 30 de Janeiro e talvez um governo novo à volta do dia dos namorados. A Grécia resolveu o problema em 25 dias, nós vamos precisar de quatro meses.
De qualquer maneira, mesmo com estes prazos bizantinos, o menos mau é mesmo ouvir o povo em eleições.

 A geringonça de Jerónimo

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