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Fragmentos de um Diário – 14 Agosto 1984

 Fragmentos de um Diário - 14 Agosto 1984
13.05.23
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De Marrocos ficou-nos a paisagem humana e os cheiros das especiarias das medinas por onde gostávamos de caminhar. Mesquitas, só entrámos em duas. A nossa preferência era sentarmo-nos nas esplanadas a olhar o movimento da vida árabe.
Finalmente na Costa da Caparica, descansámos, como quem regressa de uma guerra. Fomos diretamente para o apartamento da Fátima tomar banho, despir a armadura do pó dos caminhos. E só no dia seguinte, depois do pequeno almoço, fomos ao encontro dos pais da Fátima.
O mar, a praia, a linha do horizonte marítimo ali em frente das janelas do nosso quarto e da sala, num quinto andar de um prédio da Costa da Caparica. Como se num barco navegássemos. Ah! O mar da minha infância, de uma cidade à beira-mar plantada, como cantava um poeta acerca do país, e para sempre abandonada porque à infância não se regressa, e a uma cidade cujo nome delapidaram, também não.
De olhar o mar não me cansava. E do corpo do meu amor, de um moreno já modelado por umas poucas de horas de praia, também não me cansava de o olhar e de o moldar ao meu.
Parte das manhãs e das tardes eram dedicadas à família, na praia, nas refeições, em alguns afazeres comuns. Mas não me queixava. Eu tinha uma predileção pelo mar, esquecia-me dentro de água, a brincar, a nadar, a tentar dominar uma prancha de surf e a jogar à bola. A Fátima vinha por vezes ter comigo, mas obrigava-se a não abandonar por muito tempo os pais, que apenas vinham banhar os pés, as pernas, preferiam sentar-se na toalha. O pai, ao fim de dois dias, deixou mesmo de nos acompanhar, ficava-se pelas esplanadas a beber, a fumar e a ler o jornal desportivo.
Mas depois vínhamos para o nosso apartamento.
O que eu mais gostava logo ao entrar era despirmo-nos e deitarmo-nos na cama, com o largo horizonte do mar à nossa vista, a encher-nos de plenitude a alma e os sentidos. Mas a Fátima dizia quase sempre que a Costa da Caparica não a convencia como pátria do nosso futuro. Avançava mesmo com a hipótese de vender mais tarde o apartamento. Eu pedia-lhe que não, que o deixemos para férias.

 Fragmentos de um Diário - 14 Agosto 1984

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