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“Federação de Judo tem ainda de retratar-se perante alguns atletas. E vai fazê-lo”

Foi reeleito há poucas semanas como presidente da Federação Portuguesa de Judo. Sérgio Pina é de Viseu e foi na cidade de Viriato que se apaixonou por uma modalidade que hoje representa ao mais alto nível. Nesta entrevista pede tempo para ser paga a dívida da Federação, promete lutar para alterar quadros competitivos, confia num judo mais presente nos programas escolares e acredita no lançamento da primeira pedra para a 'cidade do judo'

Carlos Eduardo Esteves
 "Federação de Judo tem ainda de retratar-se perante alguns atletas. E vai fazê-lo"
09.11.24
fotografia: Jornal do Centro
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 "Federação de Judo tem ainda de retratar-se perante alguns atletas. E vai fazê-lo"
13.11.24
Fotografia: Jornal do Centro
 "Federação de Judo tem ainda de retratar-se perante alguns atletas. E vai fazê-lo"

Escolheu Viseu para a tomada de posse enquanto novo presidente da Federação de Judo. É importante as instituições darem este exemplo de descentralizar estes momentos altos do desporto?

É o mais importante. As instituições devem entender o território português e eu sempre me preocupei que o judo tenha palco em todas as regiões do país. Já estava previsto que a tomada de posse decorresse em Viseu e numa conversa com o presidente do Instituto Politécnico de Viseu ele propôs-me que decorresse lá. Foi uma cerimónia com muita dignidade e orgulho-me muito de ter decorrido na minha terra natal.

Definiu como objetivo o rigor financeiro. Como estão as contas da Federação?

Esse vai ser o nosso alicerce nos próximos quatro anos. Houve aqui projetos que não foram previamente tratados para garantir o financiamento, nomeadamente os ‘grand-prix’ e um campeonato do mundo. Há sempre valores que têm de ser pagos à Federação Internacional de Judo para podermos realizar essas provas. Não digo que vamos tentar, mas sim, que vamos conseguir, renegociar com a Federação Internacional de Judo. Já temos reunião pedida para podermos, ao longo do tempo, cumprir os encargos que foram feitos.

Está esperançoso que esse acordo chegue a bom porto?

Não tenho dúvidas. Tenho a certeza que vamos conseguir. Já falamos com o presidente da União Europeia de Judo informalmente e temos a garantia de que vamos ser apoiados e conseguiremos cumprir.  Esta é uma fase em que nos estamos a apresentar a quem nos tutela, que é a secretaria de Estado do Desporto e ao IPDJ. Depois de abordarmos a situação real com quem nos tutela vamos definir estratégias.

Qual é o valor da dívida?

Há já alguns pagamentos a ser feitos, mas a dívida andará na ordem dos 900 mil euros.

Com esta dívida, onde é que reside a sua esperança?

Se me disserem que tenho um ano para pagar esta dívida, garantidamente que é impossível. Temos de ter tempo e com o tempo vamos reduzir a dívida. E não podemos ser megalómanos e pensar em provas do circuito mundial nos primeiros anos de mandato, obviamente.

Há que abdicar…

Claro que sim. Vamos continuar a organizar as Taças da Europa.

Prevê conseguir pagar esta dívida a quanto tempo?

Convenço-me de que entre um mandato, um mandato e pouco isto está tudo saldado.

A Federação com este cenário de endividamento tendia a descredibilizar-se?

Não. O que aconteceu foi que houve uma rutura completa entre quem liderava a Federação e os órgãos que tutelam a Federação. Quando não há confiança, nem um diálogo franco e aberto, normalmente criam-se situações que fazem com que as coisas não aconteçam. Quando da Federação há uma atitude de permanente confronto em relação a quem nos tutela, normalmente isto nunca leva a bom porto. As situações azedam e cada um se vira para seu lado e não há forma de trabalhar.

Foi público o desagrado de alguns atletas de judo em relação à Federação. Já foram feitas as pazes com esses judocas?

A ponte pode não estar totalmente feita, até porque tivemos uma grande preocupação de criar todas as condições para que os atletas fossem o mínimo prejudicados, uma vez que estávamos na preparação para os Jogos Olímpicos de Paris. A minha primeira preocupação foi falar de uma forma rápida, fazendo-lhes entender que os processos iam ser diferentes, que estavam outras pessoas, que faziam as coisas de forma distinta. A Federação ainda vai ter de retratar-se perante alguns atletas.

Tem acenado outra bandeira. É sua vontade que o judo tenha instalações tipo cidade do futebol. É objetivo para cumprir até ao fim do mandato?

É. Se não conseguirmos, vão ser lançadas as raízes. Neste momento temos a sala de judo no Jamor. Foi substancialmente melhorada sobretudo na circulação de ar, mas não tem luz natural, está numa segunda cave. São instalações com colunas no meio do tapete e devíamos conseguir outros locais com mais dignidade. Se fosse possível, as instalações deveriam ter duas componentes: treino, com as valências de musculação, fisioterapia e alguns gabinetes médicos e, quem sabe, com alojamentos.

E dessa infraestrutura advirão melhores resultados desportivos?

Acredito que sim. Quanto melhores forem as condições de treino, futuramente vai refletir-se.

Olhando já para os próximos Jogos, há trabalho a ser feito relativamente a separar os atletas destas questões administrativas?

Eles não deverão preocupar-se com isso. Os atletas vão ter sempre as melhores condições de treino. Vamos fazer um trabalho de retaguarda.

Que objetivos tem estabelecidos até 2028, ano do fim do mandato?

Além de aumentar o número de atletas federados, queremos fazer uns ajustes ao quadro competitivo nacional. Queremos alterar o facto de os atletas só terem os campeonatos zonais para apurar-se para os campeonatos nacionais. Deve haver mais um conjunto de provas, semi-abertas e abertas e com pesos de ranking diferentes, para que haja um quadro competitivo maior. Vamos trabalhar mais na vertente no judo para invisuais ou atletas de baixa visão. Não podemos esquecer o resultado brilhante que tivemos nos Jogos Paralímpicos de Paris, em que o Djibrilo Iafa foi medalha de bronze. Além de continuarmos a querer trabalhar o judo adaptado.

Olhando agora para a base, para a formação de novos atletas, o judo está devidamente integrado nos programas de desporto escolar?

Temos de fazer um trabalho de base muito grande. Nos últimos anos, houve uma rutura completa entre a Federação e o desporto escolar. O ano letivo começou agora e um dos trabalhos que vamos ter é reunir com o Ministério da Educação com o objetivo que se reative o judo dentro das escolas. Há algum trabalho que estamos já a fazer, mas queremos que um maior número de jovens possa ter acesso a esta modalidade. Nesta fase há uma espécie de viveiro nas escolas. Temos de ter o engenho de mostrar e motivar que o judo é uma família e que faz bem pertencer-lhe.

Os clubes formadores deverão estar a viver uma situação delicada financeiramente. Que planos tem para apoiar estas instituições?

Normalmente cada clube tem uma forma de estar própria. Há casos em que é oferecido o equipamento, outros em que os atletas numa primeira fase não pagam nada. Enquanto federação apoiamos as associações que estão espalhadas pelo país e são as associações que apoiam, dentro dos possíveis, os clubes.

A prática do judo é díspar de região para região?

O maior número de atletas de judo está concentrado no litoral. Quanto mais para o interior vamos, temos judo e até de qualidade, mas sobretudo nas categorias mais novas. Os atletas chegam a uma fase em que vão estudar para as universidades. E é aqui que, ou deixam a modalidade, ou indo para os grandes centros urbanos como Lisboa, Porto, Setúbal, deixam os clubes de origem e optam por outras instituições. O judo jovem está perfeitamente espalhado por todo o país, quando chegam aos escalões de 16, 17 anos, está mais litoralizado.

E Viseu segue essa tendência?

Sim. Há o Judo Clube de Viseu e a Associação de Judo de Viseu. O judo em Viseu existe maioritariamente até à altura do ensino secundário. Os jovens a partir daí vão estudar para fora e a grande maioria deixa a modalidade.

A sua ligação que tem ao judo começa quando?

Foi quando estudava na Escola Secundária Alves Martins, estava o Judo Clube de Viseu a começar, no pavilhão antigo do Fontelo. O meu mestre na altura era o senhor Figueiredo. Comecei a praticar judo, mas por razões médicas não pude continuar. Foi um momento difícil, mas na verdade nunca deixei esta paixão. Entretanto estive fora de Viseu durante oito anos e a certa altura o meu filho descobriu o meu cinto de judo. Um dia apareci no treino do Judo Clube e o judo nunca mais me largou. Isto já faz trinta anos. Continuei na modalidade, quer no clube, quer na Associação de Judo de Viseu. Desde 2016 que faço parte dos órgãos sociais da Federação Portuguesa de Judo e já fui eleito por duas vezes enquanto presidente.

Esta modalidade trouxe o quê à sua vida?

É um desporto que obriga a um respeito por valores que ficam para a vida. Tem naturalmente atritos até porque há uma vertente competitiva. Eu falo com muitas pessoas sobre isso e há um denominador comum: valores como o respeito e a solidariedade imensa estão sempre no judo.

Como é que projeta o judo a quatro anos?

Vamos ter um judo de certeza com mais atletas federados e a respirar financeiramente muito melhor. E teremos também um conjunto de atletas que nos permitirão sorrir depois dos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 2028.

Com embaixadores para a modalidade?

É óbvio que todas as modalidades têm nomes. A Telma Monteiro é uma das referências e assim será. Tal como o Jorge Fonseca. Nesta altura são as referências, mas há outros. No grupo que foi a Paris 2024 destacou-se a Patrícia Sampaio que saiu medalhada dos Jogos.

Como viseense gostava de ver alguém a brilhar a esse nível?

(pausa). Isso era, isso era… Era um sonho enorme. Podem não estar num clube de Viseu, mas serem de Viseu. Temos alguns atletas de Viseu que estão a treinar fora de Viseu. As pessoas não imaginam o sacrifício pessoal para os atletas estarem num nível olímpico. É um sacrifício que é só para os eleitos.

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