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Victor Leal, presidente da Termalistur – Termas de São Pedro do Sul, foi reconduzido no início do ano para mais um mandato à frente da Associação das Termas de Portugal (ATP). A realidade do termalismo no país e na região de Viseu, os desafios e as preocupações são alguns dos temas da conversa com o também vice-presidente da Associação Europeia de Promoção e Defesa da Cultura Termal. O aumento de clientes é outra dos assuntos debatidos com o dirigente que, devido à limitação de mandatos, deixa as Termalistur no final deste ano
Foi reeleito presidente da Associação das Termas de Portugal. Que desafios têm pela frente as termas de Portugal e da região de Viseu?
Os desafios são muitos. Ainda não nos recompusemos completamente daquilo que foi a pandemia. Em todo o país, ainda estamos com níveis pré-pandémicos. É preciso continuar a investir na atração de novos públicos que deixaram de frequentar as termas. O foco das termas é, e continuará a ser, o termalismo terapêutico, as suas várias valências e as formas de o melhorarmos com novos tratamentos e através da investigação que nos permita conhecer mais sobre as diversas patologias e efeitos terapêuticos das águas termais. Vamos procurar desenvolver sinergias com universidades, institutos e outras entidades que queiram aprofundar essa investigação. E, por outro lado, criar uma nova oferta para estas novas tendências do mercado cada vez mais dirigidas para o well-being [bem-estar] em que se procurará desenvolver ofertas mais holísticas. A instância termal pode ser ótima para aquilo que hoje achamos ser a doença do século XXI, que são as doenças mentais e os problemas do foro psicológico. As termas têm que se preparar para construir ofertas e programas nesta área.
Há muitas pessoas a procurarem as termas devido aos transtornos mentais?
É uma área que tem vindo a ser desenvolvida. Por exemplo, em França existem programas bem explorados e termas especializadas neste tema. Mas, há muita procura, vivemos num tempo de muito stress, burnout e é preciso fazer estes “retiros” e as estâncias termais são bons locais para isso.
Falou nas quebras devido à pandemia. Qual foi o impacto em termos de números e qual é o cenário atual?
As percentagens de quebra foram superiores a 50 por cento, em muitas termas chegou a 70% e algumas deixaram mesmo de funcionar. Em muitas delas, atualmente, estamos 5% abaixo daquilo que era 2019 em termos de faturação. Mas ano após ano, temos vindo a aumentar. Em 2024, e tendo por base números de janeiro a setembro, tivemos um aumentou de cerca de 8%, com mais de 85 mil clientes, sendo que a grande maioria, mais de 60 mil, são clientes de termalismo de bem-estar e cerca de 22 mil de termalismo terapêutico. Em termos de faturação, houve também um aumento a rondar os 8%, sendo que aqui o valor mais elevado diz respeito ao termalismo terapêutico.
Esta recuperação acabou por ser natural ou houve um trabalho por parte das empresas?
Por um lado, houve um trabalho profundo por parte da associação e até com o apoio da Turismo de Portugal para criar campanhas, mas também cada uma per-si foi criando formas de procurar quem já frequentava as termas e de atrair novos públicos, novos segmentos de mercado. Outro dos fatores que contribuiu para o sucesso dessa recuperação foi a introdução da comparticipação dos tratamentos termais que arrancou em 2019. No período pós-pandémico continuámos a receber muitas prescrições e isso tem sido uma grande ajuda.
O objetivo é aumentar estes números?
Até outubro de 2024 contabilizam-se 11 mil prescrições nas termas portugueses, sendo que esperamos encerrar o ano com cerca de 15 mil. É um número interessante e que ajuda muito o termalismo em Portugal e é esse trabalho que estamos a aprofundar, procurando resolver alguma entropias que existem.
Apesar destes números, há ainda uma resistência em olhar para as termas como forma de tratamento?
Há clínicos que acham interessantes os tratamentos termais enquanto auxiliares para apoiar e minorar os efeitos dessas patologias. Cabe-nos a nós aprofundar o conhecimento que existe na área e divulgar esse conhecimento.
Falou em entropias. O que é preciso alterar?
Há uma necessidade de regulamentação da lei. Por exemplo, a validade da prescrição ou os montantes, há aqui um conjunto de situações que têm de ser aprofundados.
A adaptação das termas quer à evolução de doenças, quer ao tipo de utentes que as procuram, é o trabalho que espera continuar a potenciar nos próximos anos?
No dia 8 de fevereiro vamos ter uma reunião, no Luso, de todos os gestores termais e de todos os diretores clínicos do país para começarmos a iniciar este debate, perceber onde estamos, para onde caminhamos, quais as novas tendências, de que forma podem criar valor, novos produtos e programas.
Desde a sua reeleição que tem falado muito no trabalho coletivo…
Atualmente, somos 48 termas a funcionar no país com vários tipos de organizações, desde as mais fortes às mais pequenas. O trabalho em conjunto, a partilha, o conhecimento entre todos é fundamental, porque há organizações que têm acesso e meios internos mais pujantes. Se uma estância está mal, o setor está mal, mesmo que algumas estejam bem.
As termas são elementos de diferenciação das regiões?
Só na região centro estamos a falar de 24 territórios termais e cada um tem a sua importância e diferenças. Na região de Viseu Dão Lafões, por exemplo, os territórios termais têm uma importância muito forte em alguns concelhos, como São Pedro do Sul ou Castro Daire, entre outros. Mas, há um fator que é transversal a quase todos os territórios que é a questão na aposta do turismo e o turismo tem que ser visto de uma perspetiva muito mais integradora. Não há só turismo de natureza, de aventura, quando alguém visita um território quer ter um conjunto de propostas e a experiência termal entra como um produto compósito que tem que ser afirmado.
É também membro da Agência Regional de Promoção Turística Centro de Portugal. Qual é o posicionamento do setor na região de Viseu?
A nível da região centro, o termalismo sempre foi uma aposta muito forte, inclusive da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro. A CIM Viseu Dão Lafões também tem na sua estratégia um plano de saúde e bem-estar e existe um forte empenho dos municípios termais na requalificação dos seus equipamentos.
Também na região de Viseu se verifica um crescimento em clientes e na faturação?
Esse crescimento está a ser sentido. A título de exemplo, em São Pedro do Sul, que representa a maioria do termalismo na nossa região, em 2024, na área do bem estar, crescemos 20%, a nível de faturação e frequência.
Olhando para São Pedro do Sul, termas do qual é presidente, este aumento é o regresso de quem já visitava ou há novos públicos?
No segmento de wellness e bem-estar a fidelização é inferior ao termalismo terapêutico. Em 2024, no termalismo terapêutico tivemos uma fidelização na ordem dos 70% e no bem-estar estamos a falar de um grau de fidelização que será no máximo de 30%. E, portanto, é um público mais volátil, que vai passando, que vai conhecendo o concelho. Mas a verdade é que temos cada vez mais público a fazer essas experiências termais, a procurarem os programas de bem-estar, a fazer um cross selling muito importante para nós, na parte da dermocosmética. Temos uma linha própria e usamos nos nossos tratamentos wellness e wellbeing, além de fazer a venda desses produtos. Em São Pedro do Sul temos bem definido o nosso plano de ação nas áreas de atuação.
E qual é esse plano?
Temos o balneário D. Afonso Henriques direcionado para o termalismo terapêutico, fortemente ancorado nos tratamentos termais para as vias respiratórias e para as musculoesqueléticas. Temos uma forte aposta numa fisioterapia diferente e alternativa o que faz com que a reabilitação venha a crescer cerca de 20% ao ano e é uma aposta para continuar e para fortalecer. E depois temos o novo balneário D. Amélia, que vai entrar em obras financiadas pelo Plano de Recuperação e Resiliência num investimento de mais de três milhões e meio de euros, em que vamos ter um grande centro wellness para bem-estar termal e que está ancorado com a dermocosmética.
Olhando para a região, quais os principais problemas e desafios?
A maior dificuldade de quem está num setor que precisa de trabalhar com vários stakeholders e players é o facto de nem sempre ser fácil trabalhar em rede e nós precisamos disso. Quem pensa que gerir termas ou gerir uma unidade termal se restringe ao serviço termal não terá sucesso. É preciso criar produtos compósitos, sinergias com o vinho, com o património e outros. Estou crente que, na nossa região, há uma sensibilidade muito grande pelos principais responsáveis que são os presidentes de câmara e acredito que todo o trabalho surtirá efeitos.
Pela limitação de mandatos, não vai poder recandidatar-se à Termalistur [termas de São Pedro do Sul]. São 12 anos à frente da Termalistur e quase 10 na Associação Nacional que grandes diferenças destaca?
Talvez os equipamentos termais. Hoje temos dos melhores balneários a nível europeu e não estou a exagerar, porque também sou vice-presidente da Associação Europeia [de Promoção e Defesa da Cultura Termal] e conheço muitas termas por essa Europa fora. Uma coisa posso garantir aos portugueses, temos dos melhores balneários termais que existem na Europa e temos pessoas extremamente qualificadas a trabalhar nesses balneários e a qualificação e formação dos funcionários é também uma grande preocupação. Depois há outras inovações, como as linhas de dermocosmética e a parte do bem-estar que era insignificante há 10 anos e hoje, em alguns balneários, representa mais de 50% da faturação.
Há espaço para evoluir na próxima década?
Há muito para criar, há muito para fazer em termos de oferta de produtos novos. Há ainda muito para evoluir na área da dermocosmética. Em França, por exemplo, a grande cosmética está ancorada em águas termais. Este é um setor de futuro.
A falta de mão de obra também é um problema no termalismo?
Passamos uma grande dificuldade no que toca a recursos humanos e recrutamento. Depois há um problema grave no caso especial das termas que é o facto de serem sazonais, o que não permite ter uma estabilidade muito grande do ponto de vista contratual e isso obriga a uma grande rotação do pessoal, o que não é bom para a formação e para a qualidade de serviço. Trabalhar numa perspetiva de sete dias por semana também não é fácil na altura de encontrar pessoas. Os recursos humanos são um desafio enorme. Em São Pedro do Sul, por exemplo, no ano passado chegámos a ter 193 funcionários e para ser um ano a correr muito bem precisava de 210 a 215 funcionários e não consegui.
Além da falta de pessoas, a falta de atratividade do salário é um dos problemas apontados pelos sindicatos.
Acho que os políticos ainda não abriram bem os olhos para o problema que estamos a atravessar. As empresas estão esmifradas do ponto de vista das margens e com toda a estrutura de custos não conseguem pagar melhores salários e, ao mesmo tempo, os salários que pagam não são atrativos para os trabalhadores. As empresas não pagam mal porque querem, podem haver exceções, mas a maioria dos empregadores querem dar as melhores condições. Hoje, ser empresário em Portugal é um caos e o desafio maior é esse.
É vice-presidente da Associação Europeia de Promoção e Defesa da Cultura Termal. Qual a função desta entidade?
Esta associação procura, acima de tudo, manter a herança, a cultura termal, mantendo-a viva em todos os países, quer do ponto de vista patrimonial, quer da própria cultura termal. Procura criar sinergias, havendo projetos transacionais de partilha e de conhecimento. Ainda há pouco tempo tivemos na CIM Viseu Dão Lafões, que é parceira de um projeto, em que estiveram países desde a Lituânia, França, Itália, a visitar a região. E a associação pretende também fazer um centro de trabalho de sensibilização junto das instituições da União Europeia à necessidade de apoios à cultura termal.
Como é que o termalismo nacional é visto lá fora?
Acho que a imagem que Portugal passa é extremamente positiva e acho que foi por isso que fui indicado pelos meus colegas para ser vice-presidente. As termas da Europa têm um carinho muito grande por Portugal, porque consideram a herança e história termal portuguesa como uma mais valia e valorizam a prática termal desenvolvida. Em Portugal temos bons exemplos daquilo que se pode fazer a nível europeu na defesa das termas, como a recuperação de balneários romanos em Chaves ou São Pedro do Sul.
Os utentes estrangeiros representam um número significativo nas termas nacionais?
Ainda é residual para aquilo que queremos e também é nisso que vamos continuar a trabalhar.