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Umas das noites, ela leu este poema da Florbela Espanca:
EU
Até agora eu não me conhecia.
Julgava que era Eu e eu não era
Aquela que em meus versos descrevera
Tão clara como a fonte e como o dia.
…
Andava a procurar-me – pobre louca! –
E achei o meu olhar no teu olhar,
E a minha boca sobre a tua boca!
…
E lemos outros, e mais outros, baixinho, quase ao ouvido um do outro, numa voz que aos poucos se nos enrouquecia. Muitas vezes, quase chorávamos, outras, interrompíamos a leitura para nos olharmos num entendimento feito de cumplicidades.
E o dia do adeus chegou, do nada. Do nada, porque vivíamos já como se para sempre. Não contabilizávamos as horas, os dias desfaziam-se na clepsidra do tempo sem darmos por isso.
18 de Agosto de 1983
E de novo, em Portugal, sem ela, na verdade, também sem mim, porque na verdade toda a minha alma permanece naqueles anexos de um hotel em Berna.
Não saio de casa desde que cheguei. Imobilizado no quarto, apenas escrevi para a Fátima, escrevi num estado tão lastimoso de sentimentalismo que, hoje ao reler os montes de páginas acumuladas, achei razoável rasgá-las. E escrevi algo mais digno da maturidade do meu amor. Sim, acho eu que há um certo tipo de pieguice que não enobrece o amor, é mesmo a sua negação.
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