incursed
ruben simeo trompetista
agenda 2025
som das memorias logo
261121082345cbd31e4f08cbc237fdbda2b5563900947b148885
261121083019a9f55af575cc44675655afd52fd8ee0b7e8852f2

No terceiro episódio do programa “Bem-Vindo a”, tivemos o prazer de conversar…

25.12.24

São mais de 100 presépios, de diferentes tamanhos e construídos ao longo…

24.12.24

A taróloga Micaela Souto Moura traz as previsões do Tarot, na semana…

23.12.24

por
Joaquim Alexandre Rodrigues

 Ócios e entreténs

por
Jorge Marques

 O Fim ou o Princípio?
Home » Notícias » Colunistas » Fragmentos de um Diário – 16 de Agosto de 1984

Fragmentos de um Diário – 16 de Agosto de 1984

 Fragmentos de um Diário - 16 de Agosto de 1984
03.06.23
partilhar

Percebi o quanto ela amadurecera interiormente. Não deixou de ser a miúda dos perfumes, quer na simplicidades das roupas, na franqueza dos gestos, quer no modo quase maternal como me ama, a mim, que naquele tempo, ainda era mais miúdo que ela em todos os aspetos. Tudo nela ganhou profundidade, sem se adulterar. Penso no seu gosto por Mozart. Ouve-o sem vaidades, sem anúncios, eu nem sabia, mas ouve-o como dantes escutava música pop, com o mesmo despojamento, ainda que com um outro tipo de exigência. Admiro também a sua disponibilidade intelectual para a aprendizagem. Estuda por gosto de aprender. Aprender a compreender melhor o mundo e a si própria. Ainda que tudo se iniciasse no singelo desejo de me acompanhar intelectualmente.
Depois de ela partir, percebi que tudo se precipita dentro de mim. Não há volta a dar-lhe, a ausência provoca-me a desertificação da alma. Fragiliza-se-me o sentido de orientação, como um barco sem bússola. A memória, que poderia servir de alavanca para a esperança, apenas reforça a consciência do vazio que me restou. Sou dramático, sou patético, mas preciso destas feridas para o meu teatro interior. Não sei, nem quero viver a normalidade da vida de todos os dias. Preciso da melancolia para atapetar o chão do quotidiano. Há os que se esforçam por expulsá-la das suas vidas. Eu dou-lhe as boas vindas. Gosto de viver melancolicamente. Apesar dos protestos por vezes neste diário inscritos. É a minha razão de vida na ausência do meu amor. Sou assim, e pronto.
Junto da Fátima, a melancolia que em mim persiste é, no entanto, diferente. Às vezes, nem a sinto. Se calhar, nem é bem melancolia, mas um reconhecimento da brevidade da vida. Eu e ela um dia deixaremos de existir, penso nisto algumas vezes. Aquele rosto transformado em máscara, aquele corpo em pó desfeito, o sentimento que nos une sem uma alma que o sustente, são imagens terríveis que me sufocam. Mas estar ao lado dela suaviza a carne viva desta angústia projetiva. Longe dela pesa-me esta realidade como se de repente fosse arrebatado para o subúrbio insalubre de uma grande cidade estrangeira. Faço as perguntas próprias dessa circunstância: onde estou? Que faço aqui? Quem é esta gente? Porquê?

 Fragmentos de um Diário - 16 de Agosto de 1984

Jornal do Centro

pub
 Fragmentos de um Diário - 16 de Agosto de 1984

Colunistas

Procurar