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Este ano, no final do verão, Portugal enfrentou novamente grandes incêndios florestais, resultando em vastas áreas ardidas e perdas humanas e materiais irreparáveis. Nas últimas décadas, como têm demonstrado vários anos catastróficos em termos de área ardida, a região de Viseu, Dão e Lafões tem-se mostrado particularmente vulnerável. A Região foi mesmo a mais afetada pelos incêndios de setembro, já contabilizando mais de 50 mil hectares ardidos em 2024.
Esta realidade está intimamente relacionada com o enquadramento socioeconómico e as dinâmicas do território e do clima e a sua evolução histórica. A partir do final do século XIX procedeu-se à arborização dos baldios comunitários e de propriedades privadas, alterando o território, até aí mais aberto, o que oferecia mais resistência à ignição, à progressão e aos impactos dos incêndios.
Entretanto, a partir de meados do século XX, acentuou-se fortemente a aposta em monoculturas florestais intensivas, com pouca diversidade. Primeiro com o pinheiro, depois, massivamente, através da introdução do eucalipto. Nas últimas décadas, no Interior Centro-Norte de Portugal, a desertificação demográfica e o abandono da agricultura familiar e da criação de gado ampliaram a extensão e a continuidade da biomassa combustível.
O uso do solo passou a ser menos “entremeado” entre floresta, matos, terrenos agrícolas e pastorícia, ocupação que reduzia a propagação do fogo. As políticas públicas centraram-se no combate aos incêndios, deixando a prevenção e o ordenamento florestal para segundo plano. Assistiu-se também ao declínio dos serviços florestais, que outrora contribuíam para a vigilância e a prevenção.
A partir de 2000, e sobretudo após 2017, avultados investimentos duplicaram a capacidade de combate, tanto em meios técnicos como humanos, reduziram significativamente as ignições e parecem ter melhorado a evacuação de emergência, evitando novas tragédias como sucedeu em Pedrógão.
De facto, em anos de condições climáticas amenas, a aposta tem surtido efeito. Porém, nos anos de condições extremas, com temperaturas elevadas, ventos fortes e humidade relativa do ar anormalmente reduzida, os incêndios têm-se mostrado incontroláveis e os esforços de combate pouco eficazes.
Com as Alterações Climáticas que já nos assolam, a que Portugal é particularmente vulnerável, os fenómenos meteorológicos extremos – como as secas e as ondas de calor – serão cada vez mais frequentes, intensos, prolongados e imprevisíveis.
O novo regime de incêndios florestais tem uma fase crítica ampliada, abrangendo a Primavera e, particularmente, o início do Outono, atingindo já o litoral e os centros urbanos. Além disso, os incêndios de 2017 e 2024 demonstraram uma maior “explosividade”, afetando vastas áreas de forma repentina e violenta, algo que não era tão comum no passado, com incêndios mais numerosos, mas mais contidos.
Para mitigar os efeitos dos incêndios florestais num contexto de agravamento, é fundamental atuar na qualificação dos meios técnicos e, sobretudo, na vegetação.
Apesar dos mega investimentos no combate, continua evidente a falta de qualificação do pessoal e a desadequação de meios e procedimentos tradicionais para travar ou atenuar o avanço inclemente dos “novos” incêndios catastróficos.
No plano do ordenamento, de uma forma ou outra, é consensual entre especialistas: é indispensável diminuir a continuidade das áreas florestais e diversificar a sua composição. Porém, é improvável que se consiga alterar significativamente a paisagem florestal e rural em menos de 30 anos. De facto, apesar das múltiplas políticas propaladas, pouco tem sido concretizado no terreno, inclusive nas áreas devastadas pelos incêndios de 2017.
Assim, a curto-médio prazo, a redução da área ardida, da severidade e dos efeitos dos incêndios passará muito pela gestão do povoamento vegetal e respetiva carga combustível. Será fundamental reduzir a acumulação de biomassa e fomentar estruturas que dificultem a propagação do fogo, como a criação de aceiros, limpeza de mato na floresta, desbastes e desramações.
Por outro lado, muitos especialistas defendem cada vez mais que a inflexão do abandono florestal só será conseguida com o aumento do rendimento florestal dos proprietários e da comunidade local. Políticas de compensação do Estado, através do pagamento dos serviços do ecossistema prestados pelas floresta, são imprescindíveis para o futuro sustentável da floresta portuguesa e do Interior!
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