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O segundo livro de Rui Couceiro, intitulado “Morro da Pena Ventosa” e editado pela Porto Editora, foi apresentado quer pelo autor, quer pelo professor doutor da Escola Superior de Educação de Viseu (ESEV), Fernando Alexandre Lopes, na Biblioteca Municipal de Viseu.
A apresentação do livro começou pelo docente e ambos os intervenientes centraram-se no interior da obra, sem que isso implicasse a revelação do livro sem a sua leitura. O docente convidado a orador deu especial relevo ao escritor Rui Couceiro.
O autor do livro e ex-aluno da ESEV foi elogiado pelo seu ex-professor, convidado a palestrar, que explicou que nas aulas e nos trabalhos “já se vislumbrava um grande escritor, por causa da intertextualidade propiciatória que levava”. Fernando Alexandre Lopes compreendeu que, após ler a obra, “Camilo Castelo Branco está aqui celebrado de uma forma indelével, inteligentíssima e sub-reptícia”, porque o livro retrata a cidade do Porto e Camilo Castelo Branco é considerado o escritor do Porto, apesar de ter nascido em Lisboa, que em 2025 comemorará 200 anos do seu nascimento.
“O Camilo foi um escritor que nasce em Lisboa e que é o escritor do Porto, como Eça é um escritor que nasce no Norte e é o escritor de Lisboa”, afirma.
O docente relevou ainda a escrita de Rui Couceiro, seja no capítulo “Um copo de água não se nega a ninguém”, ou no destaque que deu a expressões, como, “ela acerejou” e “ele algibeirou a mão direita”, ou “o degrau apontado ao céu de uma escada que conduz a outra versão de nós mesmos,” nomeando que é “uma escrita que vai aos recônditos ínfimos e íntimos da palavra, cuja sensibilidade e heterogeneidade só a tem quem é bom escritor”.
Além de Camilo Castelo Branco, foi dada a nota de que Almeida Garrett também teve espaço neste livro, pois também é do Porto e faz do Porto a sua terra, onde o uso do vernáculo da cidade ficou compelido no livro, pelo que “há uma frase que está bem encaixada: «se na nossa cidade há muito quem troque o ‘v’ pelo ‘b’, há muito pouco quem troque a honra pela infâmia e a liberdade pela servidão»”, reitera o ex-professor de Rui Couceiro.
Fernando Alexandre Lopes teceu, por fim, a ideia de que o livro “Morro da Pena Ventosa” é “um vício, em que uma pessoa começa a ler e não para, e é efetivamente uma fonte de cultura e de conhecimento que o autor tinha e que aqui está (…) que, com o fator da memória, impõe emoção, subjetividade e criatividade (…) num livro que combate o solipsismo, no diálogo ficcional com um “tu””, como é o caso da personagem “Elisabete (Beta) Fragata”, narra.
Em síntese, o professor da ESEV concluiu, após a leitura e citação do livro, que “este romance seria muito digno de ser dado num curso de reintegração social”, dada “a vida sovada” das personagens, exortando assim à necessidade “da poética do desafogo”. “Nós temos que ler o outro, saber ler o outro, é uma responsabilidade”, reclama o professor, na “originalidade e profundidade destas asserções”, lidas em voz alta por alunas da ESEV durante a apresentação.
O último intento apresentativo do pedagogo da ESEV frente à obra foi o de mostrar o que o filósofo Umberto Eco também mostrou: “uma obra literária tem um conjunto de espaços em branco que vão ser preenchidos pelas sucessivas leituras dos leitores ao longo dos séculos pela cooperação interpretativa (…). O fenómeno literário é aberto e a partir do momento em que este jovem escritor chegou a esta obra, esta deixou de ser dele, é do público, e não há maneira mais inteligente de acabar uma obra do que a concitar dentro da estória à história da literatura e a concitar a esses pontos de indeterminação que a obra literária concita a todo o momento e a fazer com que cada um de nós saiba preencher os espaços em branco que propositadamente Rui Couceiro deixa para nós”.
Por outro lado, na altura de discursar Rui Couceiro, o escritor agradeceu a todos os presentes, e acrescenta que “de facto, estamos na mão de quem nos lê”. “O objeto está em bruto e os leitores vão lapidando-o”, nota. Apesar disso, e em contraponto, depois de se ter dito que o livro tinha muito conhecimento, cultura e memória, Rui Couceiro disse que “divide os escritores em dois universos (…) [e que] gostaria de ser mais um escritor da imaginação do que um escritor da memória”, deixando a ressalva de que “o que nós achamos que é imaginário muitas das vezes não é imaginário” e que “esta narradora, a Beta, que é uma mulher que passou por todas as agruras, consegue uma redenção na sua vida através da fantasia, que a salva e é muitas vezes real”. “Na literatura tudo é permitido por conta da imaginação e pode levar o leitor por vários caminhos para vários lugares”, pronuncia.
Ao final, Rui Couceiro transmitiu que o romance se baseia e situa no Porto, porque “como disse Jaime Cortesão, «o Porto é granítico de face e carácter», e é uma cidade literária, com o carácter e a identidade das pessoas, que fizeram deste Porto antigo, o Morro da Pena Ventosa, a verdadeira cidade invicta, onde os invasores nunca entraram e onde viviam os portuenses originais”.