Autor

Joaquim Alexandre Rodrigues

30 de 12 de 2023, 09:34

Colunistas

Buongiorno principessa

Artigo publicado na edição impressa do Jornal do Centro de 29 de dezembro

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1. Quem, na A25, viaja em direcção ao mar ou em direcção a Espanha vê “aventoinhas” nas cumeadas e ouve “piiiissss!” da via verde quando passa debaixo dos pórticos. As vistas para as serras são boas, aqueles sons não. Enfim, do mal o menos: em 2024, no bissexto ano quase a começar, as portagens vão aliviar 30%, o que melhora alguma coisa a boa-disposição das pessoas, embora não tanto como quando, a rodarem em direcção ao mar, já perto do nó para a A1, vêem um pontão em que alguém escreveu BUONGIORNO PRINCIPESSA e pensam nas suas princesas ou nos seus príncipes.
É uma citação cinéfila, claro, remete-nos para uma sequência do filme “A Vida É Bela”, em que Guido (o genial Roberto Benigni) toma conta do microfone do campo de concentração e diz “bom dia” à sua “princesa” Dora (Nicoletta Braschi, mulher de Benigni no filme e na vida real).
Não há vez em que eu passe debaixo daquele pontão sem sorrir. Quem pintou aquilo? Quem é a “principessa”? Como é ela? Como fez o “príncipe”? Debruçou-se de cabeça para baixo com uma trincha na mão? Foi trabalho de equipa?

Um dos melhores filmes de 2023, “O Sol do Futuro” do também italiano e não menos genial Nanni Moretti, começa com uma pichagem em que um militante do Partido Comunista Italiano, pendurado numas cordas, pinta uma a uma, letras exactas e perfeitas numa parede muito alta.
Neste seu último filme, Moretti conta-nos a ruptura do PCI com a União Soviética quando esta, em 1956, invadiu a Hungria. Ao mesmo tempo, o realizador desloca-se de trotineta de um lado para o outro, enquanto declara o seu desamor às netflixes deste mundo e o seu amor eterno ao cinema em sala escura, onde “há uma luz” que conta histórias de “principessas” em écrans grandes.
E sim, do outro lado do mesmo pontão da A25, talvez pendurado por cordas como aquele militante comunista do filme de Moretti, o mesmo “príncipe” escreveu o título da canção angustiada dos The Smiths: THERE IS A LIGHT THAT NEVER GOES OUT.
Que a luz da tua “principessa” nunca se apague, pintor amável. E a luz das salas de cinema também não.

2. Bom 2024!