Autor

José Carreira

25 de 01 de 2023, 10:52

Colunistas

Os professores merecem respeito

Quando não há resultados, muda-se o treinador ou todos os futebolistas?

Temos assistido, nas últimas semanas, ao endurecimento da luta dos professores. Uma luta digna, justa e que merece o respeito de toda a comunidade. São fortes, mais ou menos justas, as críticas feitas ao Ministro da Educação, a mais curiosa foi a do humorista Ricardo Araújo Pereira (RAP): “Os professores portugueses não sabem ensinar. Não há outra razão para estarem há anos a explicar a mesma coisa a vários ministros da Educação e nenhum deles ter ainda percebido. A culpa não pode ser dos ministros, que são gente sofisticada e esperta…”

RAP tem razão, mas talvez deva, na sua elucubração, considerar os representantes dos professores em particular e não a totalidade do corpo docente. São os líderes sindicais quem, em regra, explica aos sucessivos ministros as reivindicações de toda a classe. Alguns dos interlocutores diretos dos sucessivos ministros já não devem dar uma aula há anos, talvez esta nuance ajude a explicar as dificuldades que terão na transmissão dos objetivos de milhares de mulheres e homens que fazem da Escola uma instituição fundamental no combate às desigualdades, no funcionamento do elevador social, na construção da democracia. Usando a linguagem do “futebolês”, faço duas perguntas: 1) Um treinador que não conhece o cheiro do balneário pode vencer jogos? Quando não há resultados, muda-se o treinador ou todos os futebolistas?

De inconseguimento em inconseguimento, também eles, os representes sindicais, serão vítimas da inaptidão dos nossos professores que não lhes conseguem fazer entender a importância que têm, numa sociedade democrática que tem na educação um dos seus baluartes?
Se os ministros da Educação, melhores ou piores alunos, são sucessivamente substituídos, o mesmo não deveria ocorrer com os líderes sindicais que se eternizam nos cargos, repetindo táticas inconsequentes?

A contratação e colocação de professores, o modelo de avaliação de desempenho, a baixa remuneração, a burocracia kafkiana, o descongelamento do tempo de serviço são questões que atormentam a vida dos docentes há muitos anos. O fracasso negocial é uma evidência. Estaremos na presença de anjos (sindicalistas) e demónios (ministros)? Confesso, nunca gostei do estilo de Mário Nogueira. Mas desde que decidiu fazer o número das laranjas e dos mirtilos, para explicar a carreira dos professores, atirar colheres para o chão e partir pratos em direto, não consigo compreender o que leva os professores a elegerem-no consecutivamente. Nada me move, pessoalmente, contra Mário Nogueira, mas convenhamos que, passados todos estes anos (foi eleito pela 1.ª vez em 2007), ser reeleito, em 2022, numa lista única colocada a votação para o Conselho Nacional, com 90,34% dos votos, é algo surreal. O que leva os professores a votarem massivamente? Os professores têm visto as suas reivindicações vingar? Não me parece. Não há mais professores e professoras para o desempenho da função? Algo está a mudar, ainda que lentamente e inorganicamente. Há um novo rosto na luta dos professores, André Pestana, líder do STOP. À união da classe docente, parece sobrepor-se a divisão sindical. Tenho assistido, com alguma preocupação, ao pulular de estratégias criativas de formas de luta, talvez eficazes no imediato, mas duvidosas do ponto de visto legal e, muito provavelmente, prejudiciais para o apoio da comunidade, algo essencial à luta dos professores. O que terá levado, durante o período da Geringonça, assim foi batizado, por Vasco Pulido Valente, o anterior Governo do PS, que contou com o apoio à esquerda (PCP e BE), os sindicatos a cumprirem uma espécie de serviços mínimos?
Quando há 22 anos entrei, pela primeira vez, numa escola, recordo a frase de uma “colega”: “Caro José, como canta o Jorge Palma, este é o 1.º dia do resto da tua vida.” Não se cumpriu a profecia. Apenas estive mais uma vez, numa escola, cumprindo os requisitos da profissionalização em serviço, no ano letivo 2003/2004. Um ano feliz, de concretizações e emoções. A verdade é que, ainda hoje, na minha atividade profissional me chamam “professor”. Talvez porque fui, durante anos, professor no Centro de Atividades dos Tempos Livres das Obras Sociais de Viseu, com muito orgulho. Devo muito a alguns professores que marcaram o meu percurso pessoal, académico e cívico. Foram também eles os impulsionadores do elevador social que me retirou das condições difíceis em que vivi a infância e a juventude.

Repito, ad nauseam, ser bom professor dá muito trabalho, requer esforço, dedicação, paixão, empatia, solidariedade, resiliência (…) Os bons professores (creio que serão a maioria) merecem o reconhecimento social e o respeito de cada aluno, de todas as famílias, da comunidade em geral e da sua tutela em particular. As mudanças que se impõem, se queremos ter um sistema de ensino que responde às necessidades do século XXI, só terão sucesso com o envolvimento dos professores.