Autor

Maria Leitão

04 de 02 de 2024, 12:14

Colunistas

Viver com cancro: a importância do apoio multidisciplinar

O cancro é uma realidade que afeta inúmeras vidas em Portugal, alterando não apenas a saúde física, mas também a dinâmica emocional e social dos doentes e das suas famílias. Os cuidados paliativos devem começar a ser vistos como um primeiro recurso, essencial por tratar cada doente em todas as suas dimensões, com equipas multidisciplinares

Em termos científicos, o cancro é uma condição caracterizada pelo crescimento anormal e descontrolado de células no organismo. Esta multiplicação celular desordenada pode originar tumores malignos e, em alguns casos, espalhar-se para outras partes do corpo. Existem diversos tipos, cada um com características distintas, o que torna essencial um diagnóstico preciso e um tratamento individualizado.
Receber um diagnóstico de cancro é um ponto de viragem na vida da pessoa e da sua família. Para o doente, a jornada é marcada por tratamentos por vezes complexos, muitos com efeitos adversos importantes, com impacto na qualidade de vida, na imagem corporal e alterando profundamente a existência de cada um.
Podem existir perdas sucessivas: de identidade, de planos de futuro, de dinâmicas habituais. A família, o pilar mais comum de apoio ao doente, depara-se com um conjunto de desafios práticos, sociais e emocionais. De um dia para o outro, às vezes sem aviso, muda a rotina de todo o agregado familiar. A comunicação sobre assuntos difíceis como é o caso traz consigo constrangimentos reconhecidos. Ansiedade, medo e tristeza podem tornar-se companheiros diários do doente e dos seus mais queridos.
Assim, a melhor gestão do doente com cancro não é apenas uma tarefa para oncologistas. A intervenção de uma equipa multidisciplinar é essencial para abordar todas as dimensões da pessoa. Coligar o conhecimento de diferentes especialidades médicas e cirúrgicas é fulcral para definir o melhor plano para cada caso. A equipa de enfermagem especializada traz consigo uma diferente capacidade de cuidar, com psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, grupos de voluntários e de serviços solidários – cada membro desempenha um papel determinante na construção de uma vida digna para o doente.
Em Portugal, os cuidados paliativos ainda são vistos como um “último recurso”, mas esta perspetiva ultrapassada não podia estar mais longe da realidade. São equipas especializadas com uma formação singular na sua abrangência, permitindo abordar o doente e a respectiva família de forma dinâmica e holística, considerando a pessoa no seu todo e avaliando as necessidades de cada momento do percurso de doença, de modo a intervir proporcionalmente a cada passo. Trazem assim uma ajuda inigualável e multifacetada, merecendo um reconhecimento que tem demorado a chegar.
É crucial que a sociedade se una na promoção de uma abordagem mais solidária e informada em relação ao cancro. Ao reconhecer a importância da equipa multidisciplinar no apoio de doentes e famílias, podemos transformar este caminho, oferecendo esperança e compreensão a todos aqueles que enfrentam a exigente jornada do cancro em Portugal.

Maria Leitão?Oncologista no Hospital CUF Viseu