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O capitalismo financeiro vive cada vez mais das rendas e cada vez menos dos lucros. Está a haver uma espécie de regresso aos tempos pré-capitalistas em que quem era rico vivia das rendas que as terras lhe davam. Só que, na altura, a riqueza era imóvel e agora mexe-se à velocidade da luz e vai tomando conta do comum — a água, o vento, o sol, os solos, os subsolos, as estradas, os hospitais, …
Exemplos há muitos e têm sido dados aqui em profusão: as PPP rodoviárias socráticas pingam, durante décadas, rendas de dois dígitos. As eólicas idem-idem-aspas-aspas. As águas do sul do distrito de Viseu são um massacre para os consumidores com as suas generosíssimas remunerações de capital.
Os rentistas exercem o seu controlo à distância, através de contratos complexos, que tornam difícil perceber-se até quem são os seus titulares. Quem é, de facto, o “dono” dos Centros Escolares de Santa Comba Dão feitos em PêPêPês? Quem é o verdadeiro “proprietário” da A25? Quem é que, no final da cadeia, ia ficar com as rendas do pavilhão transfronteiriço que aquele autarca incauto queria fazer em Caminha?
As coisas são assim e aqui têm sido descritas. Como é sabido, os rentistas têm uma enorme influência junto do poder e, por norma, conseguem levar a água ao seu moinho. A grande advocacia de negócios torna estes contratos deliberadamente opacos e enrodilhados para que os seus titulares e os governos se possam, o mais possível, subtrair ao escrutínio público.
Como vimos, neste universo, a regra é o nevoeiro e a opacidade. Mas não há regra sem excepção: no caso do aumento das portagens das auto-estradas para 2023, que está na ordem do dia, as coisas são muito fáceis de analisar. Vamos ao que está em causa:
(i) os rentistas querem que as portagens subam 10% (a Ascendi, esta semana, referiu uns especiosos 10,44%);
(ii) o aumento dos salários no próximo ano vai ser à volta de 5,1% (valor acertado em concertação social);
(iii) as pensões mais pequenas sobem 5%, as médias 4,07% e as grandes 3,53%.
Perante estes números, é fácil fazer o teste do algodão ao governo:
— aumentos das portagens na ordem dos 4 a 5%: algodão limpo;
— aumentos entre 6 a 7%: algodão sujo;
— acima disso: algodão encardido, governo completamente no bolso dos rentistas.
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Joaquim Alexandre Rodrigues
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