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“Se continuar a haver milhões de pessoas sem horizontes de vida, o populismo terá sempre terreno fértil”

Chamar-lhe mulher resistente é certo, mas pouco. É ainda hoje mensagem de esperança e símbolo dos que nunca desistem de um mundo livre e justo. Sofreu às mãos da tortura e da repressão do Estado Novo, esteve presa, mas nunca vergou aos ideais que sempre defendeu. Diz nesta entrevista que não poderia ficar indiferente à pobreza e à desigualdade. Aos 89 anos é este sábado homenageada em São Pedro do Sul. Eis Conceição Matos, nome maior da luta antifascista em Portugal

Carlos Eduardo Esteves
 “Se continuar a haver milhões de pessoas sem horizontes de vida, o populismo terá sempre terreno fértil”
01.03.25
Jornal do Centro
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02.03.25
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 “Se continuar a haver milhões de pessoas sem horizontes de vida, o populismo terá sempre terreno fértil”

Que lição deixa a Conceição Matos, que foi uma resistente, numa altura em que a extrema-direita cresce no mundo?
Quem ama a liberdade, quem sabe o que significaram 48 anos – quase meio século – de fascismo, com tudo o que isso significou de sofrimentos e privação das mais elementares liberdades, não pode deixar de se preocupar com o renascimento de forças ameaçadoras para a vida democrática. Seria difícil de imaginar que quando se comemoram 80 anos da derrota do nazi-fascismo, com o fim da sangrenta Segunda Guerra Mundial e 51 anos dos momentos exaltantes que foi o 25 de Abril, com todas as suas transformações políticas, sociais, económicas, culturais e no nosso modo de viver coletivo, que viveríamos novas preocupações quanto a estarem garantidas as liberdades. Uma coisa temos como certa: se não se dá resposta aos problemas e anseios das pessoas, se continuar a haver milhões de pessoas sem horizontes de vida, os populistas encontrarão um terreno fértil para a propaganda milagreira.

Como se tornou revolucionária, resistente e tão valente?
O Barreiro onde cresci era uma terra onde os trabalhadores travavam corajosas lutas contra a exploração e pela liberdade. Muito jovem me identifiquei com a luta contra o fascismo. Muito cedo aderi ao MUDJUVENIL e, mais tarde, ingressei no PCP, que tinha uma grande influência no Barreiro e organizava a resistência ao fascismo. Muito jovem comecei a caminhar para as prisões para visitar o meu irmão Alfredo, preso duas vezes e brutalmente torturado. Comecei a participar em manifestações contra o regime, a distribuir propaganda clandestina, a participar na defesa dos presos políticos. A minha entrega à luta foi ditada pelo dever de não ficar indiferente à miséria a que os trabalhadores eram sujeitos e de lutar pela liberdade. Uma decisão que sabia que poderia acarretar enormes sacrifícios.

Quais os momentos que mais a marcaram na sua vida: os bons e os maus?
Naturalmente que uma pessoa como eu, que chegou aos 88 anos, viveu muitos momentos bons e maus. Mas pelo que representaram na minha vida e do nosso povo, o acontecimento mais feliz foi a conquista da liberdade no 25 de Abril de 1974 e o fim dos dias escuros em que vivíamos. O pior momento foi a prisão e as brutais torturas a que foi submetida, os vexames da PIDE que feriram a minha condição de mulher e os longos anos em que não pude ver o meu companheiro também ele preso e brutalmente torturado.

Quem foram os seus exemplos durante os anos de luta?
Os meus exemplos foram todos os homens, mulheres e jovens que nunca aceitaram que o país estivesse condenado a viver privado da liberdade, sujeito a miséria e ao obscurantismo e que tiveram a coragem de dizer não ao fascismo, todos os que generosamente deram o melhor das suas vidas e não poucos a própria vida para que os portugueses tivessem a liberdade como modo de viver. Naturalmente foram para mim um grande exemplo os que caídos nas mãos da PIDE resistiram às torturas, mostrando que as firmes convicções são mais fortes que a violência fascista.

Consegue perdoar a quem tanto mal fez a si e a Portugal?
Nunca reclamei vingança, nem me parece que isso seja um bom sentimento. Reclamei como o fizeram muitas outras vítimas do fascismo que fosse feita justiça, que os crimes da PIDE e de outras forças repressivas que torturaram milhares de pessoas, incluindo crianças, que assassinaram centenas de opositores do regime, fossem julgados. É inadmissível e um atentado à memória dos que foram assassinados que os crimes do fascismo tivessem ficado impunes.

 “Se continuar a haver milhões de pessoas sem horizontes de vida, o populismo terá sempre terreno fértil”

Que mensagem deixa aos jovens de hoje que queiram lutar?
Aos jovens a quem a liberdade é tão natural como respirar, que desfrutam de conquistas e direitos e de que várias gerações estiveram privadas é preciso que saibam que a liberdade conquistada representou enormes sacrifícios incluindo milhares de jovens e que é seu dever lutar para que a liberdade perdure. Sem liberdade não há futuro.

Se um jovem lhe perguntar o que era ser mulher e resistente antes de abril, o que lhe diz?
Em primeiro lugar é necessário que as mulheres que nasceram depois do 25 de Abril saibam que, no fascismo, as mulheres eram legalmente consideradas cidadãs de segunda, privadas de muitos direitos concedidos aos homens, privadas de direitos específicos, sujeitas a discriminações humilhantes na família, mesmo em relação aos filhos, impedidas de acesso a numerosas profissões que hoje são vulgares como era o caso da magistratura, que em alguns casos como as enfermeiras eram proibidas de casar. Enfermeiras houve que foram presas e condenadas a pesadas penas por terem lutado pelo direito ao casamento. As mulheres eram as mais exploradas de entre os explorados. A mulher ideal segundo os critérios fascista a mulher estava destinada a cuidar do lar, a procriar, a ser submissa e obediente. A brutal violência da PIDE sobre as mulheres resistentes terá a ver com facto de, segundo os critérios fascistas, as mulheres cometerem um duplo crime: lutavam contra o regime e subvertiam a moral fascista sobre a submissão.

Mas tiveram um dos principais papéis nessa época…
As mulheres tiveram um papel da maior importância na resistência. Foram decisivas no funcionamento do aparelho clandestino, estiveram na vanguarda de muitas greves, tiveram papel determinante na luta histórica pelo horário das 8 horas de trabalho nos campos em 1962, pelo que foram sujeitas a uma violência inaudita pela PIDE. Cerca de 3000 mulheres estão registadas como tendo estado nas cadeias do fascismo, algumas durante longos anos. Catarina Eufémia, assassinada quando, com outras mulheres de Baleizão reivindicavam melhores salários, tornou-se um símbolo da luta das mulheres contra o fascismo e pelos seus direitos, mas o número de mulheres assinadas pelo fascismo ascende a treze e cujos nomes constam no memorial do Museu de Peniche aos dedicado aos que morreram pela liberdade. As mulheres foi quem mais ganhou com a Revolução de Abril desde logo com a proclamação legal da igualdade homem/mulher. As mulheres resistentes são por direito próprio Cravos de Abril.

O que recorda de São Pedro do Sul?
As recordações de São Pedro do Sul são muito marcadas pelos diferentes momentos em que aqui estive. Nasci em Negrelos, junto à estação do comboio. Com três anos fui viver para o Barreiro para onde o meu pai se deslocou com toda a numerosa família na esperança de melhorar as condições de vida. Daquela época quase só recordo a passagem do comboio uma grande atração para uma criança. Voltei a viver uns tempos em São Pedro aos 18 anos em casas de familiares, quando tive a tuberculose e os médicos recomendavam ares puros, coisa que não havia no Barreiro marcado pelo fumo das fábricas químicas. São Pedro tinha ares puros, mas a vida da maioria das pessoas era paupérrima, os apoios sociais nenhuns e as casas sem água, sem luz e sem saneamento básico. No entanto deixou marcas a fraternidade de pessoas que tinham tão pouco. Depois do 25 de Abril passei a vir regularmente a São Pedro do Sul e estadias prolongadas. Recordo o reencontro familiar no meio da alegria da liberdade que era vivido por boa parte da população, mas também a desconfiança ao verem uma comunista em carne e osso quando toda a vida lhes tinha sido dito que os comunistas comiam criancinhas ao pequeno-almoço. São Pedro do Sul sofreu enormes transformações com a Revolução de Abril em todas as áreas. O poder local democrático deu às populações a possibilidade de aceder a bens inimagináveis no fascismo.

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