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“Se ser purista é defender que não se deve inventar nas questões da sabedoria popular, então sou purista”

Carlos Eduardo Esteves
 "Se ser purista é defender que não se deve inventar nas questões da sabedoria popular, então sou purista"
14.09.24
fotografia: Jornal do Centro
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 "Se ser purista é defender que não se deve inventar nas questões da sabedoria popular, então sou purista"
21.09.24
Fotografia: Jornal do Centro
 "Se ser purista é defender que não se deve inventar nas questões da sabedoria popular, então sou purista"

Com 91 anos e uma vida dedicada às questões da etnografia, António Lopes Pires confia que tão cedo o folclore não acabará. O antigo inspetor olha com ânimo para o trabalho dedicado à etnografia que tem sido feito nas universidades. Assume-se um purista nas questões do folclore porque, diz, todas as coisas da vida devem ser levadas a sério e critica quem tenta adaptar a tradição aos tempos de hoje. Viseu recebe a 21 de setembro o Desfile Nacional do Traje Popular Português

Falámos em 2018, há seis anos, por alturas do Europeade, o mais relevante evento europeu de etnografia e folclore que decorreu em Viseu. Na altura, o sr. inspetor considerava que esta era uma iniciativa que poderia abrir o mundo do folclore e da etnografia a mias pessoas e o poderia valorizar. Seis anos depois, como está a relação entre Viseu e o folclore?

É uma relação simpática. O folclore é uma ciência. Não é algo que ande por aí a ser tratado aos pontapés por analfabetos. Há quem tenha essa ideia. Há quem acha que o folclore é dos ignorantes. A palavra folclore foi criada por um inglês, William Thoms, um estudioso das coisas da etnografia, que, por não ter muito espaço numa coluna num jornal construiu a palavra folclore. Folk, que quer dizer povo e lore, que significa ciência, sabedoria.

Passados seis anos, cumpriu-se a tal aproximação das pessoas ao folclore?

Isso não lhe consigo dizer. A minha perceção é a de que os responsáveis pelos grupos folclóricos têm continuado a desenvolver um trabalho sério. Agora, as pessoas que, de fora, observam este fenómeno, tenho algumas dúvidas de que o façam da forma que deveriam.

O sr. Inspetor é conhecido por ser um purista…

Eu entendo que todas as coisas da vida devem ser levadas a sério. Nestas questões da tradição popular, da antropologia popular, não podemos improvisar. Eu até costumava dizer aos responsáveis pelos grupos de folclore que escrevessem no teto do quarto com letras muito gordas a frase ‘proibido inventar’. Se isto é ser purista, eu sou purista. Eu entendo que devemos respeitar integralmente o saber ou sabedoria do povo.

E sente que esse desvirtuar acontece mais na letra ou no traje?

Essa é uma conversa mais comprida. Fala-me da letra e do traje, mas o folclore não é isso. Isso é uma pequena parte do folclore.

Então onde é que acha que há risco de desvirtuar?

Onde há mais risco de acontecer é o que se vê todos os dias: trajes, músicas e coreografias. Os responsáveis estão tentados a fazer um espetáculo em que a apresentação não tenha danças muito parecidas umas com as outras. E isso está errado porque estamos a reproduzir o mais fielmente comportamentos, procedimentos de antigamente. 

Já teve algumas discussões sobre isto?

Ui. Imensas. Quando tinha essas conversas, enquanto representante da Federação do Folclore Português, as pessoas diziam alguma coisa, mas desistiam porque do meu lado encontravam como que uma parede.

Porque é que então tem esse receio se a Federação do Folclore Português continua a ter a preocupação de não desvirtuar?

O meu receio já foi maior do que é agora, mas há sempre a tendência da lei do menor esforço. Em alguns grupos, os responsáveis que mantinham a linha da verdade aposentaram-se ou morreram. E quem se lhes sucedeu nem sempre foi capaz de dar continuidade a um trabalho sério que vinha de trás.

Aqui há uns anos, a grande maioria de quem dançava e cantava num rancho folclórico, cantava e dançava a vida que tinha todos os dias ao trabalhar na lavoura. Hoje são muito poucos os que fazem da agricultura uma profissão. Dentro dos grupos houve essa necessidade de adaptação?

Foi obrigatório, não adaptar, mas investigar. E essa investigação é cada mais difícil porque vão desaparecendo os livros. Os mais velhos foram morrendo e os mais novos não cultivam o fazer como viam fazer e o contar como ouviam contar. Cabe a quem está nos grupos investigar. Folclore não é só dançar e cantar em cima de um estrado. Há muito mais a fazer. Por exemplo, no domínio da literatura popular de tradição oral: contos, lendas, rezas. Isto é que é folclore. Isto é um conjunto de comportamentos e procedimentos de uma sociedade. O primeiro investigador em Portugal podemos dizer que foi o Almeida Garrett que ouvia as histórias da empregada e as publicou num livro, num cancioneiro popular. Depois dele vieram outros. Portugal dedica-se ao estudo da etnografia cerca de um século depois da maioria dos países europeus. No final do século XIX houve investigadores que foram para o terreno à procura. Um grande nome foi o José Leite de Vasconcellos.

Tornar o folclore mais apelativo para os jovens é o grande desafio…

Sei que não é fácil. Hoje há todos os apelativos, designadamente os telemóveis…

Mas essas tecnologias não podem ser usadas a favor do folclore?

Podem, devem e têm sido usadas no trabalho de recolha. Hoje é mais fácil ouvir uma velhinha a contar uma história e gravá-la. Eu ainda andei com um velho gravador de pilhas. As universidades têm feito um trabalho interessante no estudo das tradições populares. E hoje ainda há pessoas a estudar e a escrever sobre estes temas. O que me parece é que, tal como tudo na vida, o primeiro contacto com o folclore deve ser de sucesso e agradável.

Em Silgueiros sente o rejuvenescimento do grupo folclórico?

Sim, está bem renovado. Gente dedicada à causa.

Viseu a 21 de setembro vai viver o quê?

Vamos ter cá grupos etnográficos que vêm do país inteiro e das ilhas. Vêm trazer um espetáculo dedicado ao traje popular dos portugueses. São mil figurantes, cada um com o traje da região, com variantes: os de missa, os de festa, os do casamento, os do trabalho. Trajes que não têm nada a ver com os desenhadores de trajes, nem com os eruditos. Espero que seja um espetáculo que possa aproximar o grande público do tema antropologia popular. É a minha grande esperança.

O Europeade cumpriu essa esperança?

Eu já lhe disse isto: o Europeade não defende o folclore. O purismo. Defende a tal adaptação. Ainda agora assisti no festival de folclore a um grupo internacional cujos intérpretes mudaram de fato três vezes durante o espetáculo. Aquilo não tem nada a ver com folclore. Nada. Zero. E o Europeade é um pouco isto.

O sr. Inspetor pensou, fundou e dirige ainda hoje o Museu Etnográfico de Silgueiros. Como está o museu?

Neste momento vive dias tristes porque está em obras. Tivemos de encaixotar as peças. Diria que são duzentas mil. Cem mil botões, 40 mil caixas de fósforos… A nossa coleção de caixas de fósforos só é suplantada no mundo pelo Museu dos Fósforos, em Tomar. Providenciou-se a abertura de exposições: na Junta de Freguesia de Silgueiros, no Politécnico de Silgueiros, no Orfeão de Viseu e na Casa da Ribeira. E vai abrir outra no Museu do Quartzo. Temos a obra do Museu de Silgueiros espalhada pela cidade. Continuamos também a enviar uma nota informativa uma vez por mês sobre uma peça do museu. Regularmente, todos os dias 1 de cada mês. Eu escolho uma peça, tiro-lhe a fotografia e conto a história. E segue depois por mail para o mundo inteiro. Desde a Argentina até Uruguai.

Hoje com 91 anos como é que vê o futuro do folclore em Portugal? Há em si algum receio de que acabe?

Eu tenho um princípio que não esqueço: tudo quanto nasce, morre. Uns morrem mais tarde, outros mais cedo, conforme as doenças. Mas enquanto existir a Federação do Folclore Português, os grupos vão cumprir a função.

Mas o folclore não está doente…

Não, mas tem atravessado períodos bem difíceis.

E hoje? Está vigoroso?

Hoje, sim. Graças à força da Federação do Folclore Português e ao trabalho do seu presidente Daniel Café. É um entusiasta destas coisas e muito tem feito pelo folclore.

Onde é que está a sua esperança de que o folclore não acabará tão cedo?

Nas universidades. É quem tem na mão o saber, a capacidade de investigar e de mostrar ao mundo o resultado das investigações. Não só na procura de cura para o cancro, mas também de defesa da antropologia popular. A tal cura da alma.

 "Se ser purista é defender que não se deve inventar nas questões da sabedoria popular, então sou purista"

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