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António Vilarigues
Chamo-me António Nogueira de Matos Vilarigues, nasci na clandestinidade, a 27 de Dezembro de 1953. Sou filho de dois resistentes antifascistas, dirigentes do PCP. O meu pai, Sérgio de Matos Vilarigues, foi preso em 1934 quando com outros jovens colava numa rua de Lisboa umas tarjectas contra a fascisação dos sindicatos. Torturado (rebentaram- -lhe os dois tímpanos), foi condenado a dois anos de prisão. Esteve preso seis anos passados entre o Aljube, o Forte-Prisão de Peniche, a Fortaleza-Prisão de São João Baptista em Angra do Heroísmo e o Campo de Concentração do Tarrafal onde fez parte da primeira leva de presos (1936) e para onde foi já com a pena cumprida. Foi «amnistiado» em 1940, no âmbito das comemorações do aniversário da fundação de Portugal.
Passou à clandestinidade em 1942 onde permaneceu até ao 25 de Abril de 1974, 32 anos ininterruptos, sem ser preso, o que o transforma no «recordista europeu».
A minha mãe, Maria Alba Barbosa Nogueira, licenciada em ciências físicas e químicas, passou à clandestinidade em 1949, quando já tinha tudo tratado para ir trabalhar para França com a equipa de Irène Curie e Frédéric Joliot-Curie, prémios Nobel da Química.
Presa em Outubro de 1959 foi condenada a 8 anos e «medidas de segurança». Esteve presa 9 anos e dois meses. Desde muito jovem e durante toda a vida, antes e depois do 25 de Abril, uma lutadora pelos direitos das mulheres. Na prisão escreveu dois livros para crianças, enviados para mim em cartas censuradas pela PIDE, editados já em democracia. «Viagem numa flor» em 1977, com ilustrações de Ana Cunhal e «Viagem numa gota de água», em 1978, com desenhos de Miguel Flávio.
Ao que contam os meus pais era um rapaz muito activo e propenso a pregar-lhes enormes sustos. A determinada altura fiz uma birra que queria ir brincar com um jornal «Avante!» com um miúdo nosso vizinho. Ao que consta foi a gota de água. Fui «expulso» da clandestinidade com 4 anos por indecente e má figura.
Fui para casa da minha avó materna, a única ainda viva dos meus avós, e dos meus dois tios irmãos da minha mãe. Aí fui educado como «menino bem» para não seguir os exemplos dos meus pais. Sem sucesso como se nota. Foi-me inclusive escondido o apelido Vilarigues. Só tomei conhecimento quando da inscrição na escola e foi necessária a cédula.
A minha mãe foi presa tinha eu 6 anos e frequentava o colégio «Príncipe Perfeito» na Rua dos Lusíadas em Alcântara. Por lá apareceu um inspector da PIDE acompanhado de uma brigada. Fizeram-se passar por amigos do meu pai, montaram um estúdio de gravação. Gravaram livros/disco para crianças a todos os alunos e ainda cobraram 20 escudos por cada livro (!!!). Queriam saber por onde tinha andado com os meus pais. Respondi-lhes o que eles me tinham dito: em “Biarritz” e na “Costa Brava”!
Durante os nove anos seguintes caminhei para a prisão de Caxias. A partir dos dez anos quase sempre sozinho. As visitas, sempre entre as 10h e as 11h, eram inicialmente num parlatório com um corredor no meio onde passeavam PIDEs atentos às conversas. Não havia qualquer contacto físico. Haviam três vezes por ano, as chamadas visitas em comum, numa sala onde era permitido o contacto entre o preso e os familiares. Só familiares directos e nunca em número superior a três (as crianças não contavam). Logo na primeira visita em comum voei para o colo da minha mãe, parti-lhe a cana do nariz e a visita acabou mal tinha começado e não foi reatada. Portanto, em três mil trezentos e sessenta e cinco dias só pude beijar e abraçar a minha mãe vinte e sete vezes.
Durante a sua prisão a minha mãe tricou camisolas para o filho, fez dezenas de dossiers temáticos com recortes, escreveu contos e centenas de cartas. Numa dessas cartas, desenhou o que viria a ser o símbolo das conservas Tonecas (o meu diminutivo) com a minha cara.
Em Junho de 1971 foi a minha vez de passar à clandestinidade. Numa onda de dezenas de prisões estávamos incluídos eu e a minha companheira grávida de 4 meses Lígia Calapez, que já tinha estado duas vezes presa. Uma brigada da PIDE/DGS dirigida pela única mulher chefe de brigada, a PIDE Madalena, foi prender-nos em casa. Na altura estávamos na Parede, na casa de férias do meu sogro. Três dias depois, no funeral da minha avó, a porteira do prédio, num gesto solidário e perigoso, informou-nos com muitos cuidados da situação que ainda se mantinha. Fugimos para o Porto onde o PCP nos propôs a ida para Paris onde seria mais fácil o nascimento da nossa filha.
Assim foi. Passado um ano regressámos clandestinos ao país com a nossa filha Sofia. Durante os dois anos e meio até ao 25 de Abril, a Sofia passou por 3 diferentes casas clandestinas e nunca soube os nossos nomes. Nesse ano de 1974 iria para casa dos avós maternos. Felizmente tal já não foi necessário.
Até ao 25 de Abril vi o meu pai três vezes. Em 1971, em Paris, quando nasceu a minha primeira filha, o meu pai apareceu e conheceu a neta. A última e terceira vez que o vi antes de 1974 foi em Portugal, em 1972, vivia eu então nas termas de São Vicente. Foi já um encontro entre dois clandestinos.
Quanto ao primeiro encontro, esse deu-se em 1969, depois de a minha mãe ter sido libertada em Dezembro de 1968. Foi então organizado um encontro no Mosteiro de Alcobaça, junto ao túmulo de Pedro e Inês. Depois do reencontro e após uma década de separação entre os meus pais, seguimos os três para São Martinho do Porto, onde pudemos conviver um dia e uma noite. Depois separámo-nos de novo.
Que estas breves memórias sirvam para as actuais e as futuras gerações possam contar «como foi».
António Vilarigues
União de Resistentes Antifascistas Portugueses
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