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Fernando Ruas CM Viseu
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Uma linha verde pintada no chão não faz uma ciclovia

 Uma linha verde pintada no chão não faz uma ciclovia
11.09.21
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 Uma linha verde pintada no chão não faz uma ciclovia

Viseu acordou por estes dias com parte das suas ruas pintadas com umas curiosas linhas verdes, a que se juntou uma sinalização horizontal de limitação de velocidade a 30km/h e um desenho de uma bicicleta.
O projecto de introdução de ciclovias em Viseu não é novo (pelo menos no papel) e já ajudou a preencher as promessas de dois programas autárquicos.

E se a mobilidade suave vai de vento em popa noutras cidades (como é o caso de Lisboa, que começou do zero há alguns anos e que hoje recebe a maior conferência mundial sobre mobilidade em bicicleta, a “Velo-City 2021”!), nas quatro esquinas de Viseu ainda se discute a construção ou não de um novo parque de estacionamento automóvel no Mercado 2 de Maio, em pleno centro da cidade.

Finalmente a autarquia resolveu dar mais um passo na implementação da rede ciclável da cidade, introduzindo em larga escala as tais linhas pintadas – um modelo barato de vias partilhadas “pop-up” -, sem beliscar a vaca sagrada do estacionamento automóvel nem acrescentar atritos com munícipes-Velhos-do-Restelo (cujas opiniões divergentes sobre estes novos paradigmas da mobilidade respeito), mas que pouco ou nada acrescentam aos direitos que o código da estrada já prevê para as bicicletas e para os ciclistas.
Pintar linhas verdes no chão serve, na melhor das hipóteses, para recordar aos automobilistas que têm um especial dever de cuidado para com os ciclistas. Mas pouco mais. Aos utilizadores de bicicleta não trazem qualquer valor acrescentado.

Que incremento de segurança, que incentivo à utilização de bicicleta, que medidas efetivas de acalmia do trânsito acrescentam umas meras linhas verdes pintadas na estrada?
Um pai responsável ficará mais tranquilo em deixar o seu filho ir para a escola de bicicleta, neste próximo ano lectivo (por exemplo, desde a entrada sul da cidade), numa estrada partilhada e com grande fluxo de transito, graças à magia de uma risca verde?

E quem nunca se atreveu a usar uma bicicleta na estrada, por compreensível receio da competição com os carros, arriscará agora, por se sentir mais protegido por uma simples linha verde no asfalto? (a este respeito, leia-se o artigo de O Público de ontem, 05/09 “As mulheres precisam de perder o medo de usar a bicicleta na cidade” (Abel Coentrão e Rui Gaudêncio).

Porventura passarão os automobilistas a circular efetivamente a 30km/h pela mera existência da nova sinalética, num assumo de civilidade e respeito legal?
Tal opção de gestão do trânsito e do espaço urbano é compreensível em ruas como a Rua Dr. Luíz Ferreira, onde o espaço disponível está a prémio, mas porquê implementar este modelo em vias como a Av. 25 de Abril, onde se podem segregar os diversos meios de transporte?

Valerá a pena recordar, pela enésima vez, a mais do que demonstrada correlação positiva entre a disponibilidade / oferta de ciclovias (reais!) e os níveis de utilização de bicicletas? (Dill and Carr 2003; LeClerc 2002; Nelson and Allen 1997; Parkin et al. 2008). J. Dill já nos revelou até que os ciclistas estão dispostos a aumentar a distância e o tempo de deslocação utilizando ciclovias em detrimento de vias partilhadas, ainda que estas sejam mais diretas e de menor distância…

Pelo que – sem prejuízo do empurrão que a eventual introdução de bicicletas e trotinetes partilhadas venha a dar à mobilidade suave em Viseu – não nos poderemos queixar, no futuro, de quaisquer insucessos na utilização da bicicleta em Viseu.

Na semana em que o país recebe orgulhosamente um evento da dimensão da “Velo-City 2021”, vamos lá ter coragem de pensar a nossa cidade para este século, devolvendo-a às pessoas, sem medo de beliscar um ou dois lugarzitos de estacionamento e sem receio de mudar, fazendo de Viseu uma melhor cidade para viver e circular.
(quanto às curvas e contra-curvas de 90º nos fragmentos de ciclovia da cidade, essas ficam para outro dia…)

 Uma linha verde pintada no chão não faz uma ciclovia

Jornal do Centro

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