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Começou por ser visto como um acaso. A baliza ficou a zeros num jogo, depois em dois. A seguir foram três. E quatro. Cinco. Seis. Sete. Oito. Nove. Nove jogos. 810 minutos sem consentir qualquer golo de forma consecutiva na 1ª Divisão Distrital de Viseu. Foi este o registo que o Sporting Clube de Vale de Açores imprimiu esta época. Não houve adversário da primeira à nona jornada que conseguisse marcar qualquer golo à equipa do concelho de Mortágua. O clube tem, aos dias de hoje, a melhor defesa do futebol sénior distrital com quatro golos sofridos no campeonato a que se juntam dois consentidos na Taça Sócios de Mérito. Em 18 jogos, o Vale de Açores sofreu seis golos. Na mesma 1ª Divisão distrital as segundas melhores defesas são Molelos e Oliveira do Douro, com 10 golos consentidos.
André Martins é o treinador da equipa e orienta este ano, pela primeira vez, um clube no escalão sénior. Saiu há poucos meses das camadas jovens. Sobre os nove jogos seguidos sem sofrer golos, o técnico realça que esta época foi “a organização defensiva que se mostrou uma mais valia” e defende que “o facto de termos andado muitos jogos sem sofrer golos era fator de motivação para nós”. “Era uma segurança. E claro que se falava entre a malta do futebol. Diziam que íamos bater um record, mas nós não tínhamos foco em nada disso”, garante o treinador.
Passado serve de aviso para evitar foco extremo em recordes
Renato Lopes foi, até agora, aquele que mais vezes desempenhou a função de guarda-redes no Vale de Açores. E foi num desses jogos, no décimo, que viria a sofrer o primeiro golo para o campeonato. “Não posso mentir e tenho de dizer que, imediatamente quando sofri o golo diante do Vila Chã de Sá, pensei que a série sem sofrer golos tinha ali terminado. Nós sabemos que quando estas séries e recordes acontecem, as equipas adversárias motivam-se. Nesse lance, estávamos com menos um jogador em campo e, num contra-ataque, o Vila Chã de Sá marcou. O Gonçalo Coelho chutou e eu ainda toco na bola e fico com a sensação que a consegui defender, mas efetivamente ele rematou bem. Lidámos com o golo sofrido já a pensar no jogo seguinte. E voltámos aí a não sofrer golos”, realça. Recordes, garantem, foi coisa que ninguém pensou em Vale de Açores.
“Levamos sempre tudo de forma leve e tranquila porque sabemos que estamos a trabalhar muito bem”
Até porque Renato, hoje com 30 anos, lembra-se bem do que viveu há alguns anos quando era júnior no Lusitano de Vildemoinhos. “Estivemos 13 ou 14 jogos seguidos sem sofrer golos. Na altura não soubemos lidar muito bem com as expectativas, estava tudo com os olhos postos em nós e não acabámos a época da melhor maneira. Não fomos campeões. E isso ajudou-me a crescer nesse aspeto”, garante. O guardião lembra que a época este ano no Vale de Açores até começou com um golo sofrido no primeiro jogo na Taça Sócios de Mérito diante do Piães. Por isso, vinca, ninguém esteve obcecado com números e estatísticas. “Quando entrávamos em campo queríamos ganhar e tínhamos como segundo objetivo não sofrer golos. Ter a baliza a zeros leva-nos a estar mais perto de pontuar e também de ganhar jogos. No grupo de trabalho levámos sempre tudo de forma leve e tranquila porque sabíamos e sabemos que estamos a trabalhar muito bem”, esclarece.
“Se não formos nós a trabalhar, ninguém o fará por nós”, garante treinador
Na série de nove jogos sem ver as redes abanar, esteve também Diogo Sedas. De Renato Lopes para Diogo distam 10 anos de idade. O jovem guarda-redes, de 20 anos, foi titular no jogo em casa, diante do Nandufe, na vitória por duas bolas a zero. “Esta é a minha segunda época enquanto jogador sénior. No ano passado não fiz qualquer minuto. Tive oportunidade de me estrear. Ao início estava nervoso, mas a malta da minha equipa juntou-se a mim, deu-me confiança”, assume.
Voltamos a André Martins. O jovem treinador, de 31 anos, entende que números como os que o Vale de Açores está a conseguir este ano, no que aos golos sofridos diz respeito, é algo que se explica no coletivo. E no trabalho. “Temos um treinador de guarda-redes que trabalha bastante bem. O que nos diferencia das outras equipas talvez seja trabalharmos muito o que podemos melhorar na nossa equipa. Quando trabalhamos bem nos treinos, resolvemos mais facilmente os jogos. E é o que tem acontecido”, ressalva. E nos treinos é Jota, o treinador de guarda-redes do clube, que assume um dos papéis principais. “O Jota trabalha comigo quase desde que eu treino escalões de formação. Trabalha com os dois guarda-redes por igual. Para ele não há titular ou suplente. E eles superam-se a cada treino graças a esse trabalho”, reconhece.
A assumir pela primeira vez uma equipa sénior, em que, refere, “todos os dias há um mundo novo a descobrir”, André Martins diz que o Vale de Açores, está a cumprir os objetivos estabelecidos. E que a ida à fase de campeão e de subida é o atingir de um desígnio maior. “Costumamos dizer entre nós que ninguém vai trabalhar por nós. Temos de ser nós a controlar o que podemos para chegarmos às vitórias. Se não fizermos a nossa parte, ninguém o fará em nosso lugar”, justifica o treinador.
“Eu gosto muito do Guardiola, mas às vezes temos de ser Mourinho
O técnico frisa que nem sempre as equipas podem jogar de acordo com aquilo que os treinadores sonham. E dá um exemplo. “Eu gosto muito do Guardiola, mas às vezes temos de ser Mourinho ou Ancelotti. Eu privilegio uma equipa a ter bola e a dominar o jogo com bola. No entanto, há momentos em que temos de abdicar disso e ser mais objetivos, procurando o golo o mais rapidamente possível, para ganhar conforto no jogo”, sublinha.
Além de treinar, André é responsável de compras num grupo farmacêutico. “É acordar de manhã, ir para o trabalho, sair, pegar nas coisas, ir para o treino. O dia tem 24 horas, podia ter mais…”, diz, entre risos. Os treinos estão marcados para as terças, quintas e sextas. “No balneário temos de tudo: jogadores a estudar, a trabalhar, a entrar na universidade agora, a tirar doutoramentos… Tudo. E todos conseguem. Se há coisa que temos de destacar neste grupo é o compromisso de todos”, elogia. O jogador mais novo tem 17 anos, o mais velho, 39.
As boleias que servem para duas gerações conversarem
Dois dos atletas que dizem ‘presente’ aos treinos são os guarda-redes. E Diogo Sedas apanha boleia de Renato Lopes. Nas viagens, conta o guardião mais novo, fala-se de treinos e de como ser melhor diariamente. “Vejo o Renato como referência. Fico admirado com defesas que ele faz. Falamos sempre: elogio-o quando ele está bem e dou-lhe apoio quando não corre tão bem. Nas viagens até Vale de Açores costumamos falar sobre como os treinos correram. E vai-me dando dicas para melhorar”, confessa.
Diogo é lisboeta e vive há alguns anos em Molelos, localidade onde tem sede um dos clubes rivais do Vale de Açores na luta pela chegada à fase de subida. E esses jogos, assume, foram especiais. Em Lisboa, conta-nos Diogo, a bola era companhia diária. “Lembro-me de nunca irmos a casa. Estávamos sempre a jogar à bola e eu ia à baliza. Fui ganhando carinho pela baliza e desde que comecei a jogar futebol federado sou guarda-redes”, conta, assumindo que o alemão Neuer, também guarda-redes, é o ídolo de sempre.
De uma outra geração futebolística, foi num país diferente que Renato Lopes descobriu aquele que um dia elegeu como guarda-redes referência. “Desde miúdo sempre quis ser guarda-redes. Lembro-me de estar a ver a final da Champions entre o Milan e a Juventus. O Buffon fez uma grande exibição e foi aí que se deu o clique e pensei que queria ser guarda-redes. Comecei a chatear os meus pais para jogar futebol e os primeiros passos foram como médio, mas sempre a dizer que queria ir para a baliza”, conta. Vários anos volvidos, o atleta reconhece que foi a (muita!) persistência que o levou a ocupar o lugar que assume hoje no campo. “Fui tão chato que acabaram por aceder. Foi o senhor Mário no Santiago de Besteiros a primeira pessoa a deixar-me ir à baliza”, lembra. E daí para cá, é entre os postes e a barra que se sente realizado.
Além de estar a fazer uma 1ª Divisão Distrital com, até agora, 13 vitórias, um empate e duas derrotas, o Vale de Açores permanece na Taça Sócios de Mérito. Foi nessa prova, diante do Castro Daire, que Renato Lopes viveu um dos episódios mais marcantes da época. É que o jogo teve de ser decidido em grandes penalidades. E na hora h o fator feeling teve de assumir o papel principal. “Algo me disse que eu ia defender o quinto penálti. Se não o fizesse estávamos eliminados e pus na cabeça que tinha de ser. Estava bastante calmo. Era o derradeiro e tinha de ser. E assim foi. E a partir do momento que isso aconteceu tive a convicção de que íamos ganhar. E na última série, defendi”, conta Renato. A Taça é objetivo coletivo, mas também individual. “Eu já estive numa final da Taça diante do Silgueiros e perdi. É um dos títulos que me foge e que gostava muito de ter. É ir jogo a jogo”, afirma. O próximo adversário é o Resende, a atual segunda melhor defesa do futebol sénior distrital, líder da Divisão de Honra e vencedor da Supertaça de Viseu – também nos penáltis, diante do Cinfães.
Época de novidades à espera de sucesso maior
Renato Lopes é jogador de futebol há duas décadas. Numa carreira que incluiu já passagens, como sénior, por Oliveira de Frades, Canas de Senhorim, Nandufe, Vouzelenses, Silgueiros e Vila Chã de Sá, há aspetos que se vão limando. E o do peso da responsabilidade de ser “o último” a lidar com a bola e o primeiro a ser culpado pelos adeptos quando algo corre menos bem, é um deles. “Sou muito autocrítico e sofrer golos deixava-me muito pensativo no pós-jogo. Pensava no que podia ter feito de diferente. Hoje, já não me deixo afetar tanto. Já tenho plena noção de que os erros vão sempre acontecer por mais que trabalhemos”, atira.
Com Diogo Sedas forma a dupla de guarda-redes do Vale de Açores. O jovem, que cumpre, aos 20 anos, a quinta época ao serviço do Vale de Açores, garante que nunca viu uma equipa sénior “tão unida como este ano”. “O espírito de balneário é impecável”, resume. Para que o espírito de união permaneça e seja cada vez mais notado, o clube tem a tradição de, às quintas-feiras se juntar num convívio pós-treino. E se algum jogador novo se juntar, há uma espécie de praxe para cumprir. “Paga por exemplo uma grade de cerveja”, conta Diogo, entre risos. E quando lhe perguntamos quem é o Dj de serviço, o jovem guarda-redes diz, prontamente, “o Miki”. E não é propriamente por causa do gosto musical. “É o que leva a coluna é ele quem escolhe”, assume. Quanto ao mais engraçado, escolha fácil. “O Morsa. Dou-me super bem com ele e estamos sempre ambos na brincadeira”, adianta.
Entre André Martins, Renato Lopes e Diogo Sedas há um ponto em comum: neste ano desportivo, os três estão a viver uma novidade. André treina pela primeira vez uma equipa sénior, Renato faz a época de estreia no Vale de Açores e Diogo foi titular há poucos dias no escalão sénior pela primeira vez. Uma época que, esperam os três, e também os populares de Vale de Açores, continue a ser marcante. Este domingo há mais um jogo.