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Vila utópica da Irmânia ressurge na realidade em Mortágua 100 anos depois

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 Vila utópica da Irmânia ressurge na realidade em Mortágua 100 anos depois
08.12.23
fotografia: Jornal do Centro
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 Vila utópica da Irmânia ressurge na realidade em Mortágua 100 anos depois
26.12.24
Fotografia: Jornal do Centro
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 Vila utópica da Irmânia ressurge na realidade em Mortágua 100 anos depois

O advogado antifascista Basílio Lopes Pereira, que sofreu o degredo do Tarrafal, promoveu a utópica vila da Irmânia no concelho de Mortágua, um projeto relançado como realidade 100 anos depois.

A defesa de uma “terra de irmãos” de forma triangular, com sede na Marmeleira, remonta aos primórdios do século XX, acompanhou a difusão dos ideais republicanos, antes e depois da revolução de 1910, e abrandou face ao regime repressivo do Estado Novo.

Porém, as propostas algo esotéricas de Basílio Lopes Pereira (1893-1959), preso várias vezes por razões políticas, seguidas por familiares e amigos, não esmoreceram até ao 25 de Abril de 1974.

Após a Revolução dos Cravos, com o livre associativismo e a consolidação do poder local democrático, a Marmeleira deu novo impulso ao ideal do ‘tarrafalista’ e seus irmãos, Serafim Lopes Pereira e António Lopes Araújo, naturais da freguesia, cuja junta é presidida pelo socialista José Midões.

O médico João Paulo de Almeida e Sousa tem investigado a afirmação do “ideal irmânico”, um trabalho que culminou na edição, em 2022, do livro “Memórias da Vila da Irmânia – Realidade e utopia por terras de Mortágua nas primeiras décadas do século XX”.

O ex-presidente do Instituto Português do Sangue está envolvido no projeto Raízes e Memórias – Núcleo Museológico da Irmânia, criado pelo Rancho Folclórico e Etnográfico ‘Os Irmânicos’ da Marmeleira, a cuja assembleia geral preside.

“Do meu tio José de Sousa Baptista, médico, herdei o espólio documental, fotográfico e também alguns objetos, os quais cedi ao Núcleo Museológico”, revelou o autor à agência Lusa.

O valor histórico do acervo motivou o seu interesse pelos temas da Irmânia e do republicanismo local, dando especial atenção à vida e obra dos três irmãos Lopes Pereira, protagonistas da exposição “Da Beira Alta a Timor, o destino da coragem”, que ainda pode ser visitada.

“No início do século XX, Mortágua era considerada a terra mais republicana da Beira Alta”, referiu, salientando que “um dos dois únicos centros republicanos do distrito de Viseu estava na Marmeleira”.

O presidente da Câmara de Mortágua, Ricardo Pardal, reconheceu que “a Irmânia é hoje um ícone diferenciador” do município.

À Lusa, o autarca do PS enalteceu o esforço dos opositores à ditadura de Salazar “para haver educação, cultura e informação” no concelho.

“O município incentiva o Raízes e Memórias, sem nunca nos intrometermos nas suas decisões”, acentuou.

No livro “Memórias da Vila da Irmânia”, prefaciado pelo historiador Amadeu Carvalho Homem, João Paulo de Almeida e Sousa enfatizou “a disponibilidade, a coragem e a solidariedade” dos conterrâneos Lopes Pereira, perseguidos pelo regime fascista.

Em 1940, Basílio foi deportado para a Colónia Penal do Tarrafal, em Cabo Verde, de onde saiu em 1942.

António Ferreira, de 87 anos, foi professor na antiga Escola Primária que alberga agora o Raízes e Memórias.

“Este museu ainda é o reflexo da luta desses homens”, sublinhou o dirigente à Lusa, sendo corroborado por Rosa Ferreira, outra dinamizadora do Rancho ‘Os Irmânicos’, criado pelo seu pai, José Ferreira, nos anos de 1980.

Os dois partilham com João Paulo de Almeida e Sousa preocupações de dinamização cultural, social e económica, através de um triângulo associativo cujos vértices são o Núcleo Museológico, a futura Casa de Memória da Família Lopes e as Eiras dos Lopes, em diferentes locais da freguesia, que, através de painéis à beira da estrada, dá as boas-vindas à vila da Irmânia.

Os Lopes Pereira doaram esse conjunto agrícola e a antiga habitação à coletividade que prossegue o ideal dos antepassados.

Segundo João Paulo de Almeida e Sousa, as Eiras dos Lopes acolherão a reconstituição de descamisadas, malhas de milho e outros trabalhos rurais, enquanto a casa será um alojamento local, para tornar sustentável o projeto comunitário.

O processo tem contado com o apoio da Junta da Marmeleira e do município, que convergem com o Rancho Folclórico no objetivo de fomentar a cultura e o turismo numa “terra de irmãos” de forma triangular, delimitada pela Serra do Buçaco, o rio Mondego e a linha ferroviária da Beira Alta.

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