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18 de 08 de 2021, 12:32

Diário

Acabaram as pizzas e os hambúrgueres nas escolas. Diretores, pais e nutricionistas concordam

Ouvidos pelo Jornal do Centro, defendem uma melhor educação aos alunos sobre a alimentação mais saudável

pizza

Sandes de chouriço, croissants, empadas e batatas fritas estão entre os alimentos que passam a ser proibidos nos bares das escolas públicas, onde também deixará de haver hambúrgueres, cachorros quentes e sumos com açúcar adicionado.

Estas são algumas das restrições previstas num despacho publicado na última terça-feira (17 de agosto) em Diário da República que limita a “venda de produtos prejudiciais à saúde” nos bufetes escolares e nas máquinas automáticas.

O diploma apresenta uma lista com mais de meia centena de produtos proibidos nas escolas, que revela uma nova redução de sal, de açúcar e mais um corte em alimentos com elevado valor energético.

Diretores, pais e nutricionistas ouvidos pelo Jornal do Centro concordam com as novas regras e defendem uma melhor educação aos alunos sobre a alimentação mais saudável.

O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares e diretor do Agrupamento de Escolas Serpa Pinto de Cinfães, Manuel Pereira, defende que não será pela proibição que as escolas vão impedir os alunos de consumirem produtos menos saudáveis.

Em declarações ao Jornal do Centro, o responsável considera que as escolas devem educar os estudantes para a alimentação saudável e diz que educar proibindo “não dá bom resultado” e não causa efeitos nas crianças. “É bom que as escolas tenham a oportunidade de ajudar os alunos e as crianças para o consumo responsável e saudável, acompanhá-los e perceber se estão a abusar do que não devem, porque são salgados ou açucarados, e poder controlá-los do que proibir”, defende.

Manuel Pereira lembra ainda que os alunos podem comprar fora da escola os produtos proibidos pelos estabelecimentos escolares “num raio de 200 ou 400 metros da escola, nas dezenas de estabelecimentos comerciais que fornecem esses produtos”.

O diretor de Cinfães garante que as escolas cumprem a lei e que o novo despacho “não traz nada de novo”. “A maior parte dos produtos, senão todos, já não estão vendidos nas escolas há muitos anos e até há legislação que, de alguma forma, o proíbe”, afirma.

Ainda assim, Manuel Pereira admite que, nomeadamente em escolas secundárias, as máquinas de venda automática continuam a ter “produtos ainda demasiado açucarados e bebidas que não são aconselhadas”.


Pais dizem que proibição só peca por ser tardia

O presidente da Confederação Nacional Independente dos Pais, o viseense Rui Martins, está de acordo com esta medida e fala de uma decisão que faz bem à saúde dos mais novos.

“Nós somos aquilo o que comemos. E, se forem educados em terna idade para se alimentarem de forma adequada, espero que as nossas crianças não venham aos cafés ao lado das escolas degustar sandes e pizzas. Temos a esperança que isso seja um contributo para a mudança de algumas preocupações e o caminho para a alimentação equilibrada que só pode fazer bem à saúde dos nossos filhos”, diz.

No entanto, o dirigente diz que a medida só “peca por tardia” e espera que os alunos não voltem aos cafés e pastelarias. “As escolas já têm no currículo os ensinamentos na alimentação, mas depois a prática não resulta. Portanto, com uma medida destas, pode ser que resulte. Esperemos que não vão aos cafés e pastelarias”, afirma.

Rui Martins compara mesmo esta decisão do Governo com a decisão tomada nos últimos anos de impor uma taxa pelo uso dos sacos de plástico nos supermercados.


Escolas diziam uma coisa e vendiam outra, lembra nutricionista

A decisão também é aplaudida pela nutricionista Ana Ferreira, que fala de uma “obrigação” que deve ser cumprida pelos alunos que já aprendiam tudo sobre a alimentação nas salas de aula.

“Não havia concordância entre o que era informado e dito às crianças e o que tinham disponível no bar. E estas incongruências também têm de ser combatidas, em que se diziam uma coisa e apresentavam outras ofertas”, afirma.

A especialista defende que é preciso continuar a informar e esclarecer os alunos sobre as opções alimentares. “As más escolhas não estão disponíveis no bar da escola, mas continuam à venda fora da escola, e este trabalho de capacitar as crianças para escolhas informadas tem de continuar”, acrescenta Ana Ferreira.

A nutricionista defende que a lista agora conhecida de produtos que vão deixar de estar à disposição dos alunos nas escolas públicas “é mais extensa do que a lista que saiu há cerca de cinco anos para os estabelecimentos de saúde”, riscando os alimentos mais prejudiciais à saúde dos estudantes.

“Esta lista vai mais longe nas escolas e isto acabou por ser necessário porque a população continua a consumir muito sal e muita gordura. É uma lista muito extensiva, os alimentos com imenso açúcar e gordura estão praticamente identificados e proibidos. Acaba por manter-se a diversificação alimentar e promover o consumo de fruta, vegetais e hortícolas em geral”, conclui Ana Ferreira.


O que está previsto

As regras entram em vigor dentro de um mês e as escolas têm até ao final de setembro para rever contratos com fornecedores. No entanto, as prateleiras de alguns bares e expositores das máquinas automáticas poderão manter-se inalterados, uma vez que só serão revistos os contratos que não impliquem o pagamento de indemnizações.

O Governo pretende que as escolas públicas comecem a oferecer refeições "nutricionalmente equilibradas, saudáveis e seguras".

Quando as aulas começarem, as escolas já não deverão ter “bolos ou pastéis com massa folhada e/ou com creme e/ou cobertura, como palmiers, jesuítas, mil-folhas, bolas de Berlim, donuts, folhados doces, croissants ou bolos tipo queque”, lê-se no despacho.

As refeições rápidas, designadamente hambúrgueres, cachorros-quentes, pizzas ou lasanhas, assim como os gelados também têm os dias contados.

Ainda no que toca a salgados, vão desaparecem os rissóis, croquetes, empadas, chamuças, pastéis de massa tenra, pastéis de bacalhau ou folhados salgados.

As sandes ou outros produtos com chouriço, salsicha, chourição, mortadela, presunto ou bacon também passam a estar interditos, assim como as sandes ou outros produtos que contenham ketchup, maionese ou mostarda.

As alternativas poderão passar por pão com queijo meio-gordo ou magro, ovo, fiambre pouco gordo, atum ou outros peixes de conserva com baixo teor de sal ou pão com pasta de produtos de origem vegetal à base de leguminosas ou frutos oleaginosos, uma vez que todos estes são alimentos autorizados.

Estas sandes devem ser acompanhadas com produtos hortícolas, tais como alface, tomate, cenoura ralada e couve roxa ripada, sugere o ministério da Educação no despacho.

O diploma estabelece ainda o fim das bolachas e biscoitos, nomeadamente as “bolachas tipo belgas, biscoitos de manteiga, bolachas com pepitas de chocolate, bolachas de chocolate, bolachas recheadas com creme e bolachas com cobertura”.

A lista de proibições chega também às bebidas, passando a ser proibido vender nas escolas públicas refrigerantes de fruta, com cola ou extrato de chá, assim como águas aromatizadas, refrescos em pó, bebidas energéticas e preparados de refrigerantes.

Em alternativa, os bares serão obrigados a ter água potável gratuita, assim como garrafas de água, leite e iogurtes, ambos meio-gordo e magro.

Também haverá “tisanas e infusões de ervas” e “bebidas vegetais, em doses individuais”, ambas sem adição de açúcar, assim como sumos de fruta e ou vegetais naturais, que contenham pelo menos metade de fruta e ou hortícolas e monodoses de fruta.

É também o fim dos rebuçados, caramelos, pastilhas elásticas com açúcar, chupas ou gomas, assim como dos snacks doces ou salgados, designadamente tiras de milho, batatas fritas, aperitivos, pipocas doces ou salgadas.

As sobremesas doces - mousse de chocolate, leite-creme ou arroz-doce – devem dar lugar à fruta, e os chocolates e barritas de cereais podem ser substituídos por snacks de fruta desidratada sem açúcar ou snacks à base de leguminosas, que contenham pelo menos metade de leguminosas e um teor de sal inferior a um grama.

Pão, fruta fresca e saladas são alguns dos alimentos obrigatórios, segundo o diploma que define ainda a obrigatoriedade de disponibilizar sopa de hortícolas e leguminosas nas escolas com ensino noturno.

Pão com queijo fresco, com requeijão ou um queijo pouco gordo são alternativas que as escolas passam a ter.

Cabe aos diretores das escolas definir o horário de funcionamento do bufete, mas o Governo recomenda que abra 20 minutos antes do início da primeira aula da manhã e que esteja fechado à hora do almoço, “exceto nas escolas que apenas disponham de ensino secundário, em que o bufete pode permanecer aberto sempre que se justifique”.

Sobre as máquinas de venda automática, o Governo sublinha que só devem ser equacionadas quando o serviço de bufete é insuficiente e que só poderão vender o que é permitido nos bares.

Além disso, estas máquinas “não podem disponibilizar chocolate quente nem adicionar mais de cinco gramas de açúcar por cada bebida”, acrescenta o diploma, que define que devem ser instaladas longe do bufete e com acesso bloqueado quando o refeitório está a funcionar.

Já sobre as refeições escolares, devem obedecer às orientações da Direção-Geral da Educação (DGE) e as ementas devem ser elaboradas, sempre que possível, sob orientação de nutricionistas.

As ementas e a composição das refeições devem contemplar os princípios da dieta mediterrânica, assim como refeições vegetarianas, dietas justificadas por prescrição médica (como as alergias ou intolerâncias alimentares) e dietas justificadas por motivos religiosos.

Em 2017, foi criado o plano integrado de controlo da qualidade e da quantidade das refeições servidas nas escolas, onde também passou a ser obrigatório ter uma opção vegetariana.

Em 2019, foi proibida a publicidade a géneros alimentícios e bebidas de elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos trans nas escolas.

O diploma aprovado vem cumprir o definido no Orçamento do Estado para 2020, no qual o executivo ficou encarregue de estabelecer novas regras para os bares e máquinas automáticas.