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09 de 03 de 2024, 18:00

Diário

Zurrapa, a banda de punk “xunga” e mensagens ácidas apresenta o seu sexto disco na Fora de Rebanho

“Manual de Incitação a uma Vida Boçal” conta com 13 faixas, onde a política, a religião e o convívio serão temas prementes. No fim , o que importa é “não comer e ficar calado”

O dicionário de língua portuguesa define a palavra “zurrapa” como “vinho mau ou estragado”. Para a banda viseense com o mesmo nome, a definição é um pouco mais extensa. “Nascido do engaço das mais reles castas e estagiado por tempo indeterminado em pipas e cubas putrefacta, é dono de uma cor esbatida e mortiça, com aspeto algo turvo e um aroma quase fétido. Na boca é ácido, desequilibrado e praticamente intragável. O final será sempre tudo menos harmonioso.” É deste modo que a banda viseense Zurrapa descreve a bebida sua homónima.

Nuno Mendonça, baixista do grupo, considera os Zurrapa como “um grupo de amigos que acima de tudo gostam de festa, e convívio, de beber copos e de celebrar”. Formados em meados de 2017, os Zurrapa contam já com cinco discos. No dia 23 de março apresentam na Fora de Rebanho o seu sexto álbum de originais. Depois de “Na Taberna do B.A.” (2017), “Zurrapa Som Sistema” (2018), “(Des)Governo no País das Maravilhas” (2020), “Lambe-me o Cubo” (2020) e “O Triunfo dos Porcos” (2022), Zurrapa apresentam “Manual de Incitação a uma Vida Boçal”.

Ao contrário dos discos anteriores, o sexto projeto foi gravado na sua totalidade durante uma paragem entre concertos da banda. “Normalmente nós vamos trabalhando as músicas ao mesmo tempo que temos concertos. Vamos criando músicas novas nos ensaios e nos bocadinhos que vamos tendo livres”, começou por explicar Nuno Mendonça. “Desta vez decidimos fazer um bocado ao contrário. Parar mesmo um pouco com os ensaios das músicas antigas e trabalhar só músicas novas.” Para tal, o grupo começou por gravar primeiro aquilo que o baixista designou de “esqueleto” da música. “Quando decidimos gravar, foi um bocado o processo de pegar nesses esqueletos todos e transformá-los em músicas”, contou ainda.

Dois anos depois do último álbum, Zurrapa apresentam agora 13 músicas novas “um bocado na mesma linha de sempre”, onde a política, a religião e a festa dão o mote para as novas faixas de punk rock – ou “punk xunga”, como os membros do grupo gostam de dizer. Sendo uma banda que, segundo Nuno Mendonça, vive muito dos concertos ao vivo, as músicas, quando são feitas, têm já uma dinâmica própria de palco. “Já sai de uma maneira em que acabamos a música e conseguimos imaginá-la em palco”, esclareceu o baixista.

A parte de intervenção política conseguida através das músicas é, para Nuno, um dos elementos basilares dos Zurrapa. “Para nós é um tema sempre muito interessante de abordar. Claro que nós votamos e temos essa possibilidade e esse benefício que é o voto, mas expressa aquilo que nós queremos realmente através destas músicas é sempre muito mais simples para nós”, assumiu o músico de Viseu.

Já quanto à parte instrumental, o grupo tem tentado manter sempre a mesma linha desde o início, levando o punk xunga até ao seu público. “Claro que ao fim de seis trabalhos já começamos a ter algumas coisas que vamos aprimorando”, contou Nuno Mendonça.

“Se calhar, já nessa onda, houve momentos em que pensámos em tirar algo ou colocar algo porque já fica repetitivo, mas a evolução em si é quase nenhuma. É quase um objetivo nosso não fugir muito dessa linha. Não é um tipo de som para ser virtuoso, é para ser direito e divertido e interessa que passe a mensagem”, disse.

Ser punk é viver fora do rebanho
Cristas, roupa preta, maquiagem e unhas de negro ou botas de cano alto. O estereótipo visual que define alguém como sendo punk pode ser enganador, especialmente quando ser punk é, acima de tudo, uma questão de atitude. “O punk é uma cultura e é um bocado ser do contra. É não ficar calado quando nos sentimos atacados, no sentido em que se achamos que alguma coisa está mal, falamos e não ficamos à espera”, explicou o baixista. “É estar do contra, é não comer e ficar calado.”

Para Nuno Mendonça, a Associação Fora de Rebanho tem vindo a ter um papel essencial na promoção da cultura punk em Viseu, “por dar um espaço e dar palco às bandas que estão a aparecer”. “Acho que as pessoas começam novamente a olhar para o punk como música”, afirmou o baixista, dando o exemplo dos Bastardos do Cardeal, banda de punk de Viseu que retomou recentemente a sua atividade, tendo tocado na Fora de Rebanho.

“Houve uma fase em que o punk e todo o rock underground era considerado barulho e acho que já se começa a olhar outra vez para isto como uma coisa que tem interesse e que é cultural, que não é só barulho. Tem mensagem e tem interesse”, assumiu o músico de punk. “Quem gostava do punk há 20 anos continua a gostar. Não sei se haverá malta nova a começar a gostar de punk, mas quero acreditar que sim.”

A apresentação do sexto álbum de Zurrapa tem início às 22h00 na Fora de Rebanho, com os Voto Nulo, de Oliveira de Frades, a abrirem o espetáculo. No fim, será “festa e convívio”, ou, como disse Nuno Mendonça, “mais uma noite normal para nós”.