Paulo Lopes

12 de 05 de 2021, 17:50

Cultura

Ser um só

Na crónica que abre este episódio, Patrícia Portela evoca um Teatro que se integra nos seus ritmos e é peça fundamental do quotidiano. Em entrevista, Tiago Lima fala do espetáculo “Ainda estou aqui” que, em junho, chega ao palco de Viseu.

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Gostávamos que em Viseu todos sentissem que poderiam ir ao Teatro sem olhar o programa.

Gostávamos que o Teatro fosse um lugar do quotidiano, como um café, como um restaurante de vez em quando, ou uma cantina, como uma mercearia onde se vai regularmente só para comprar aquele ingrediente que faz falta ao repasto do dia.

Gostávamos que o espectador comprasse um bilhete como quem compra um jornal para saber o que se passa, como quem faz zapping numa televisão, à procura daquele filme ou daquele documentário que ainda não conhece e que lhe vai abrir portas e janelas para mundos sobre os quais nunca pensou e descobrindo que gostaria de, sobre eles, pensar.

Gostávamos que o Teatro tivesse horas certas… quem sabe conversas e leituras todas as quartas às 19H30, como hoje acontece com a Minha História da Dança de Sónia Baptista, quem sabe espetáculos e concertos todas as sextas e sábados, sempre às 21h, quem sabe debates, conferências, e outros encontros nas tardes de sábado, às 16h, como acontece este fim de semana com o Laboratório de Criação Teatral BB2021 do Fraga… e gostávamos que nesses dias, assim como quem sai para beber um café, dar um passeio ou sai para ver algo que ainda não sabe o que é mas que, tem a certeza, só poderá ser interessante.

Gostávamos que o Teatro fosse uma extensão do nosso quotidiano, uma hora marcada no nosso calendário semanal.

Gostávamos que este hábito de ir ao teatro porque sim, como quem pede uma torrada ao Sr. Zé no café Teatro, como quem compra bolachas de água e sal para ter sempre em casa, como quem não passa sem um queijinho ou um pão de lenha que só pode comprar naquela padaria que só está aberta ao fim de semana, se prolongasse por muitos anos.

Gostávamos de perceber, e de confirmar, que passados esses anos, todos nós teríamos mais amigos e companheiros, mais projetos e mais ideias sobre o mundo, mais multiplicidade e mais possibilidades de sermos tantas outras coisas. E com isso, transformarmos a cidade que nos irá transformando até não sabermos, um dia, onde começa a nossa casa, o nosso jardim e termina o teatro, onde se inicia o jornal e termina o espetáculo, onde começa a nossa vida e a vida dos outros.

Nesse dia teríamos cumprido o nosso objetivo de ser um lugar de encontro, de pensamento, de partilha e de múltiplos lugares.

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Patrícia Portela, diretora artística do Teatro Viriato