Geral

27 de 04 de 2024, 19:00

Diário

“O Futuro da Educação: Rumo a uma Transformação Global”

Como será a escola, o ensino e a educação nos próximos 50 anos? Que transformações sofrerá a escola e que valores se irão manter? As perguntas foram lançadas ao presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares e diretor do Agrupamento de Escolas de Cinfães, Manuel Pereira

Manuel Pereira

“É na Educação, talvez, que a revolução de abril mais marcas deixou”. Quem o afirma é o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, Manuel Pereira. Para o responsável, “a escola deixou de ser apenas para alguns e tornou-se universal e obrigatória, contribuindo decisivamente para a democratização da sociedade e para o crescimento cultural, responsável pela modernização do país no final do século XX”.

“É fácil para alguém como eu, que iniciou funções docentes em meados dos anos setenta do século XX, perceber e claramente sentir as enormes mudanças que a escola e a educação sofreram desde então”, afirma. Manuel Pereira recorda “que toda a tecnologia de ponta, dessa altura, não passava do quadro preto e giz e que era muito fácil competir com a tecnologia que as famílias tinham disponíveis em suas casas”.

E daqui a 50 anos? Para o Manuel Pereira, “fazer um exercício de especulação e tentar prever como será a educação quando se celebrarem os cem anos da revolução de abril, mais não será do que fantasiar sobre algo que não controlamos e que parece sempre ultrapassar as expectativas mais óbvias”.

Ainda assim, admite que “a escola não será, seguramente, como a conhecemos hoje”, mas que “o professor manterá esse papel fundamental de timoneiro nos processos de orientação, de aprendizagem e de crescimento das crianças, muito especialmente das mais jovens”. Contudo, acrescenta, “nos próximos 50 anos, a educação enfrentará uma revolução sem precedentes, moldando definitivamente a forma como as gerações futuras aprendem, se desenvolvem e interagem”.

“Com a rápida e incontrolável evolução da tecnologia e com os desafios globais, a educação estará no centro de uma transformação que promete preparar os alunos para um futuro sempre incerto, mas repleto de oportunidades. A escola e os seus principais atores terão que ter essa consciência. Terão que perceber que o processo de aprendizagem será um processo partilhado em que já não há mestres, mas em que todos têm papel ativo e níveis de aprendizagem diferente. O professor também será aluno”, explica.

Manuel Pereira destaca algumas mudanças como, por exemplo, a tecnologia que será “o pilar central da educação do futuro”. “De alguma forma já o começa a ser nos nossos dias. Teremos salas de aula virtuais, realidade aumentada e inteligência artificial disponíveis na escola. As aprendizagens serão ainda mais dinâmicas e tornarão o aprendizado mais imersivo, permitindo aos alunos mergulhar em conteúdos vários e interagirem com eles de diferentes maneirass”.

Outra das grandes mudanças poderá assentar nos currículos que “serão adaptados individualmente, oferecendo uma experiência de aprendizagem personalizada e eficaz para cada aluno. Esse será, talvez, o grande passo a dar pela escola do futuro”.

“A escola saberá incluir mais e melhor. Irá conseguir individualizar currículos e responder aos diferentes ritmos de aprendizagem dos seus alunos. Haverá uma desconstrução dos níveis de ensino de acordo com as necessidades e disponibilidades das crianças e jovens e também de acordo com metas e objetivos propostos, sempre em constante alteração e evolução. Para além disso, a escola continuará a desempenhar o papel que lhe foi atribuído desde o início dos tempos, o de transmitir os conhecimentos e informações construídos pelas gerações passadas. A transmitir a memória dos povos, tão essenciais na construção de um futuro sólido e estável e na consolidação da identidade dos mesmos”, sustenta.

Manuel Pereira refere ainda que, daqui a meio século, “a educação deverá ter também uma abordagem global e sustentável” e deverá “estar atenta ao conhecimento construído e deverá enfrentar os enormes desafios globais que, em velocidade acelerada, estão a definir o futuro”.

“As mudanças climáticas e as desigualdades sociais deverão ser objeto fundamental na construção dos currículos. Estes deverão, necessariamente, incluir a educação ambiental, a sustentabilidade e a cidadania global como pilares fundamentais na construção de um processo educativo sério e objetivo. Sim! Porque os alunos devem ter consciência de que são atores principais no processo de mudança nas suas comunidades e no mundo”.

Por outro lado, alerta, “as alterações demográficas vão obrigar a alterações curriculares na medida em que os perfis societários se vão alterar significativamente”. “A miscigenação cultural e social obrigará a alteração e adaptação de paradigmas, um verdadeiro desafio para a escola do final do século XXI. A redução da natalidade nos países ocidentais obrigará a uma cada vez maior incidência de imigrantes e fará das escolas espaços multiculturais complexos, propensos a tensões várias para as quais a escola também se deve preparar, tanto em termos de organização, como de adaptação curricular ou mesmo linguística. A escola terá que ser ainda mais flexível e acessível”, sublinha.

Um dos grandes desafios da escola e da sociedade do final do século XXI deverá ser, alerta Manuel Pereira, “a importância a dar à aprendizagem ao longo da vida”. Porque, afirma, “não terá um tempo, mas será a todo o tempo”.

Para o futuro, o responsável deixa ainda alguns receios, nomeadamente o que o “uso constante e indiscriminado das tecnologias faça das futuras gerações dependentes”. Receia, também, que “a demasiada dependência das tecnologias e do seu uso na escola, ajude a construir uma geração de analfabetos funcionais, incapazes de saber escrever de forma manuscrita” e que, na ausência da de um meio digital, “os jovens não consigam comunicar por escrito ou expressar-se”. Ainda assim, a esperança é que “seja possível, lá para o final do século XXI, atingir o equilíbrio necessário entre o digital e capacidade de usar a escrita manual”.

Manuel Pereira termina esta reflexão com a “esperança de que, nos próximos cinquenta anos, embora num processo mais acelerado e sempre incerto, a Escola continuará a dirigir-se a todos, acolherá todas as utopias e abrirá no horizonte de cada aluno todas as possibilidades”.

Manuel António Pereira